O duque de Abrantes mostrou-se digno dos feitos heroicos, que ennobreceram a sua carreira etc.pag. 68.A vida de Junot comporia quasi um romance.Nascido em 23 de outubro de 1771 contava trinta e sete annos em 1808. Estudante do collegio de Châtillon, quando rebentou a revolução, alistou se como voluntario em uma companhia de granadeiros, e combateu com denodo em defeza da patria. O valor temerario e arrebatado grangeou-lhe no quartel a alcunha doTempestade; mas a sua elevação começa em Toulon. Bonaparte conheceu-o e apreciou-o alli, e nunca mais deixou de o proteger.As proezas com que sobresaiu nas campanhas de Italia e do Egypto, e a dedicação pessoal, que sempre votou a Napoleão I, apressaram a sua carreira. Nomeado governador de Paris depois do dia IX thermidor, e casado com Mademoiselle Permon, cuja casa frequentára com Bonaparte em dias menos felizes, subiu rapidamente os postos. Em 1804 achava-se coronel general dos hussards. Embaixador em Lisboa e condecorado por D. João, principe regente com a gran-cruz de Christo, saiu da côrte portugueza em outubro de 1805 sem licença, e veiu apresentar-se a Bonaparte nas vesperas da batalha de Austerlitz, aonde realçou a antiga valentia em mais de um rasgo brilhante.Em julho de 1806 foi nomeado governador de Paris e commandante da primeira divisão militar. Prodigo e singular nos appetites, não havia ouro que o saciasse. Os excessos repentinos e fulminantes da sua ira assustavam até os amigos mais intimos. Napoleão escolheu-o para capitanear o exercito, que invadiu Portugal em 1807, e a principio não teve rasão de se arrepender. A sua marcha rapida sobre Lisboa pelas montanhas da Beira mereceu os louvores dos militares, e justificou o titulo de duque de Abrantes, com que o imperador o recompensou.A convenção de Cintra não interrompeu a carreira de Junot. Na Hespanha, na Allemanha, e outra vez em Portugal, mas ás ordens de Massena, a sua espada não ficou ociosa. Ferido gravemente no rosto durante a guerra da Peninsula recolheu-se a Paris. Depois dacampanha de 1812, em que o imperador o censurou de irresoluto em um dos seus boletins, a rasão do duque de Abrantes principiou a vacillar, e em Veneza acabou de se abysmar nas sombras da demencia. Transportado para casa de seu pae, em Montbard, falleceu a 22 de julho de 1813 de um accesso violento de febre depois de uma dolorosa amputação.Junot não era soldado rude e grosseiro. Gentil e urbano, sabia attrahir pelas maneiras, e era susceptivel de sentimentos elevados e de acções nobres. Intrepido e intelligente, se os perigos e a morte o não faziam recuar, o pezo das responsabilidades acurvando-lhe com frequencia o animo, tornava-o inferior a si proprio nas posições eminentes. Nascêra para ser o segundo e nunca para ser o primeiro nas arriscadas funcções do governo. Os erros, que lhe estranham mais, derivaram-se todos d'esta incapacidade natural. Cultor das boas artes, e dotado de gosto e critica judiciosa, a sua bibliotheca encerrava os mais bellos exemplares das edições de Bodoni e Didot impressas em velino. Em Lisboa, entre as cousas raras, que tomou para si, figuravam a famosa Biblia ornada das miniaturas de Julio Clovio e alguns quadros preciosos.Junot morreu aos quarenta e dois annos, tendo vivido por seus vicios e fadigas quasi tres edades de homem. Os costumes dissolutos, que, longe de encobrir, parecia alardear, a avidez pouco escrupulosa, com que se maculou em diversos lances, o fausto e as prodigalidades, de que se rodeava, e as furias momentaneas de um genio assomado, raiando quasi em demencia empanaram e diminuiram a gloria conquistada pelo seu valor de paladino em campos de batalha memoraveis.Sua mulher, a duqueza de Abrantes, não foi menos celebre como escritora e como dama espirituosa.DOCUMENTOSN.º 1Tratado secreto concluido em Fontainebleauentre o imperador dos francezes eel-rei de HespanhaNapoleão por graça de Deus, etc., etc., etc., havendo lido e examinado o tractado concluido e assignado em Fontainebleau em 27 de outubro pelo general de divisão, Miguel Duroc, nosso mordomo mór, etc., etc., em virtude dos plenos poderes que para esse fim lhe démos, com D. Eugenio Izquierdo de Ribera y Lesaun, conselheiro d'estado honorario de sua magestade el-rei de Hespanha, egualmente munido de plenos poderes de seu soberano, cujo tractado está concebido na fórma seguinte:Sua magestade o imperador dos francezes, rei de Italia, etc., etc., e sua magestade catholica el-rei de Hespanha, desejando de sua livre vontade regular os interesses dos dois estados, e determinar a sorte futura de Portugal de uma maneira congruente com a politica de ambas as nações, nomearam para seus ministros plenipotenciarios, a saber: Sua magestade o imperador dos francezes ao general de divisão Miguel Duroc, mordomo mór de sua imperial casa, etc., e sua magestade catholica el-rei de Hespanha a D. Eugenio Izquierdo de Ribera y Lesaun, seu conselheiro d'estado honorario, etc., os quaes, depois de haverem trocado seus plenos poderes, convieram em o seguinte:Artigo1.º As provincias d'entre Douro e Minho com a cidade do Porto serão dadas com toda a sua propriedade e soberania a sua magestade el-rei de Etruria, com o titulo de rei da Lusitania septentrional.Art.2.º A provincia do Alemtejo e reino do Algarveserão dados com toda a sua propriedade e soberania ao principe da Paz, para os possuir com o titulo de principe dos Algarves.Art.3.º As provincias da Beira, Traz-os-Montes e Extremadura portugueza permanecerão em deposito até á paz geral, em que d'ellas então se disporá, conforme as circumstancia, e pela maneira que for determinada pelas altas partes contratantes.Art. 4.º O reino da Lusitania septentrional será possuido pelos descendentes, herdeiros de sua magestade el-rei de Etruria, conforme as leis de successão observadas pela familia reinante de sua magestade catholica.Art.5.º O principado dos Algarves será hereditario na descendencia do principe da Paz, segundo as leis de successão, vigentes em a familia reinante de sua magestade el-rei de Hespanha.Art.6.º Por falta de descendente, ou legitimo herdeiro de el-rei da Lusitania septentrional, ou do principe dos Algarves será a investidura d'estes dois paizes garantida a sua magestade catholica, com a condição porém de que nunca ficarão reunidos em a mesma pessoa, nem á corôa de Hespanha.Art.7.º O reino da Lusitania septentrional e o principado dos Algarves reconhecem tambem como protector a sua magestade; e os soberanos d'estes paizes nunca poderão fazer a guerra, ou a paz sem o seu consentimento.Art.8.º No caso que as provincias da Beira, Traz-os-Montes, e Extremadura portugueza, conservadas como em sequestro, forem pela paz geral restituidas á casa de Bragança por troca de Gibraltar, Trindade, e outras colonias, que os inglezes hão conquistado aos hespanhoes e a seus alliados, o novo soberano d'estas provincias contrahirá para com sua magestade el-rei de Hespanha as mesmas obrigações, que ligam á sua augusta pessoa el-rei da Lusitania septentrional e o principe dos Algarves.Art.9.º Sua magestade el-rei de Etruria cede com toda a sua propriedade e soberania o reino de Etruria a sua magestade o imperador dos francezes, rei da Italia.Art.10.º Logo que se leve a effeito a occupação definitiva das provincias de Portugal, os principes respectivos, que d'ellas tomarem posse, nomearão entresi commissarios para demarcar os convenientes limites.Art.11.º Sua magestade o imperador dos francezes, rei da Italia, garante a sua magestade catholica el-rei de Hespanha a possessão de seus estados na Europa ao sul dos Pyrenéos.Art.12.º Sua magestade o imperador dos francezes, rei da Italia, annue a reconhecer sua magestade catholica, el-rei de Hespanha, como imperador das duas Americas, quando sua magestade catholica se resolver a tomar este titulo, o que terá logar pela paz geral, ou dentro de tres annos o mais tardar.Art.13.º Fica entendido entre as altas partes contratantes, que ellas repartirão egualmente entre si as ilhas, colonias, e mais possessões maritimas de Portugal.Art.14.º O presente tractado ficará secreto: será ratificado e as ratificações se trocarão em Madrid vinte dias o mais tardar depois da data em que foi assignado.Feito em Fontainebleau.Duroc.—E. Izquierdo.(E logo por baixo). Approvámos e approvâmos, pelas presentes ratificações o antecedente tractado, e todos, e cada um dos artigos que n'elle se contém. Declarâmos que fica acceito, ratificado e confirmado, e promettemos que será inviolavelmente observado. Em fé do que assignâmos com o nosso proprio punho as presentes ratificações, depois de lhe havermos feito pôr o nosso sêllo imperial.Fontainebleau aos 29 de outubro de 1807.NAPOLEÃO.O ministro dos negocios estrangeiros.Champagny.O ministro secretario d'estado.H. B. Marat.N.º 2EDITAL.O principe regente nosso senhor foi servido mandar remetter á mesa do desembargo do paço o decreto do teor seguinte.Tendo sido sempre o meu maior desvelo conservar em meus estados, durante a presente guerra, a mais perfeita neutralidade pelos reconhecidos bens que d'ella resultavam aos vassallos d'esta corôa; com tudo não sendo possivel conserval-a por mais tempo, e considerando, outrosim, o quanto convem á humanidade a pacificação geral: Houve por bem acceder á causa do continente, unindo-me a sua magestade o imperador dos francezes, rei de Italia, e a sua magestade catholica, com o fim de contribuir, quanto em mim fôr, para a acceleração da paz maritima. Por tanto, sou servido ordenar, que os portos d'este reino sejam logo fechados á entrada dos navios, assim de guerra, como mercantes, da Grã-Bretanha. A mesa do desembargo do paço o tenha assim entendido e faça executar, mandando affixar este por edital, e remetter a todos os logares, aonde convier, para que chegue á noticia de todos. Palacio de Mafra em vinte de outubro de mil oitocentos e sete.—Com a rubrica do principe regente nosso senhor.—Para que chegue á noticia de todos, se mandou affixar este edital.—Lisboa 22 de outubro de 1807.—José Federico Ludovici.N.º 3O governador de Paris, primeiro ajudante de campo de sua magestade o imperador, e rei, general em chefe, grão-cruz da ordem de Christo de Portugal.Habitantes do reino de Portugal.—Um exercito francez vae entrar no vosso territorio. Elle vem para vos tirar do dominio inglez, e faz marchas forçadas para livrar a vossa bella cidade de Lisboa da sorte deCopenhague. Mas será d'esta vez illudida a esperança do vosso perfido governo inglez. Napoleão, que fitou seus olhos na sorte do continente, viu a preza que os tyrannos dos mares antecipadamente devoravam em seu coração, e não soffrerá que ella cáia em seu poder. O vosso principe declarou a guerra á Inglaterra. Nós pois fazemos causa commum.Habitantes pacificos dos campos, nada receieis. O meu exercito é tão bem disciplinado, como valoroso. Eu respondo, sobre a minha honra, pelo seu bom comportamento. Ache elle por toda a parte o agazalho, que lhe é devido, como a soldados de Napoleão o grande. Ache elle, como tem direito a esperar, os viveres de que tiver precisão; mas sobre tudo o habitante dos campos fique socegado em sua casa.Eis o que eu vos prometto. Guardar-vos-hei minha palavra.Todo o soldado do exercito francez, que fôr achado roubando, será punido com o mais rigoroso castigo.Todo o individuo de qualquer ordem que seja, que tiver percebido alguma contribuição injustamente, será conduzido perante um conselho de guerra, para ser julgado segundo todo o rigor das leis.Todo o individuo do reino de Portugal, não sendo soldado da tropa de linha, que se apanhar fazendo parte de qualquer ajuntamento armado, será arcabuzado.Todo o individuo convencido de ser chefe de ajuntamento, ou de conspiração, tendente a armar os cidadãos contra o exercito francez, será arcabuzado.Toda a cidade, villa, ou aldêa, em que se derem tiros de espingarda contra a tropa franceza, será queimada.Toda a cidade, villa ou aldêa, em cujo territorio fôr assassinado um individuo pertencente ao exercito francez, pagará uma contribuição, que não poderá ser menor que tres vezes o seu rendimento annual.Os quatro habitantes principaes servirão de refens para o pagamento da somma; e para que a justiça seja exemplar, a primeira cidade, villa, ou aldêa, onde fôr um francez assassinado, será queimada, e arrasada inteiramente.Mas eu quero persuadir-me que os portuguezes hão de conhecer os seus verdadeiros interesses; que auxiliando as vistas pacificas do seu principe, nos receberãocomo amigos; e que particularmente a bella cidade de Lisboa me verá com prazer entrar em seus muros á frente de um exercito, que só a póde preservar de ser preza dos eternos inimigos do continente. Dada no meu quartel general d'Alcantara aos 17 de novembro de 1807.—Junot.N.º 4DECRETOTendo procurado por todos os meios possiveis conservar a neutralidade, de que até agora tem gozado os meus fieis e amados vassallos, e apezar de ter exhaurido o meu real erario, e de todos os mais sacrificios a que me tenho sujeitado, chegando ao excesso de fechar os portos dos meus reinos aos vassallos do meu antigo e leal alliado o rei da Grã-Bretanha, expondo o commercio dos meus vassallos á total ruina, e a soffrer por este motivo grave prejuizo nos rendimentos da minha corôa: vejo que pelo interior do meu reino marcham tropas do imperador dos francezes e rei de Italia, a quem eu me havia unido no continente na persuasão de não ser mais inquietado, e que as mesmas se dirigem a esta capital: E querendo eu evitar as funestas consequencias, que se pódem seguir de uma defeza, que seria mais nociva que proveitosa, servindo só de derramar sangue em prejuizo da humanidade, e capaz de accender mais a dissensão de umas tropas que tem transitado por este reino com o annuncio e promessa de não commetterem a menor hostilidade; conhecendo egualmente que ellas se dirigem muito particularmente contra a minha real pessoa, e que os meus leaes vassallos serão menos inquietados, ausentando-me eu d'este reino: Tendo resolvido, em beneficio dos mesmos meus vassallos, passar com a rainha minha senhora e mãe, e com toda a real familia para os Estados da America, e estabelecer-me na cidade do Rio de Janeiro até a paz geral. E considerando mais quanto convem deixar o governo d'estes reinos n'aquella ordem, que cumpre ao bem d'elles e de meus povos, como cousa a que tão essencialmente estou obrigado, tendo n'isto todas as considerações que em tal caso me sãopresentes: Sou servido nomear para na minha ausencia governarem e regerem estes meus reinos o marquez de Abrantes, meu muito amado e prezado primo, Francisco da Cunha de Menezes, tenente general dos meus exercitos; o principal Castro do meu conselho e regedor das justiças; Pedro de Mello Breiner do meu conselho que servirá de presidente do meu real erario, na falta e impedimento de Luiz de Vasconcellos e Sousa, que se acha, impossibilitado com as suas molestias; D. Francisco de Noronha, tenente general dos meus exercitos e presidente da mesa da consciencia e ordens; e na falta de qualquer d'elles o conde monteiro mór, que tenho nomeado presidente do senado da camara, com a assistencia dos dois secretarios, o conde de Sampaio, e em seu logar D. Miguel Pereira Forjaz, e do desembargador do paço e meu procurador da corôa, João Antonio Salter de Mendonça, pela grande confiança que de todos elles tenho e larga experiencia que elles têem tido das cousas do mesmo governo; tendo por certo que os meus reinos e povos serão governados e regidos por maneira que a minha consciencia seja desencarregada, e elles governadores cumpram inteiramente a sua obrigação em quanto Deus permittir que eu esteja ausente d'esta capital, administrando a justiça com imparcialidade, distribuindo os premios e castigos conforme os merecimentos de cada um. Os mesmos governadores o tenham assim entendido, e cumpram na fórma sobredita, e na conformidade das instrucções que serão com este decreto por mim assignadas, e farão as participações necessárias ás repartições competentes. Palacio de Nossa Senhora da Ajuda em vinte e seis de Novembro de mil oitocentos e sete.Com a rubrica do principe regente nosso senhor.N.º 5Instrucções a que se refere o meu real decretode 26 de novembro de 1807Os governadores, que houve por bem nomear pelo meu real decreto da data d'estas, para na minha ausencia governarem estes reinos, deverão prestar o juramentodo estylo nas mãos do cardeal patriarcha, e cuidarão com todo o desvelo, vigilancia e actividade na administração da justiça, distribuindo-a imparcialmente, e conservando em rigorosa observancia as leis d'este reino.Guardarão aos nacionaes todos os privilegios, que por mim, e pelos senhores reis meus antecessores se acham concedidos.Decidirão á pluralidade de votos as consultas, que pelos respectivos tribunaes lhes forem apresentadas, regulando-se sempre pelas leis e costumes do reino.Proverão os logares de letras, e os officios de justiça e fazenda, na fórma até agora por mim practicada.Cuidarão em defender as pessoas e bens dos meus leaes vassallos, escolhendo para os empregos militares as que d'elles se conhecerem serem benemeritas.Procurarão, quanto possivel fôr, conservar em paz este reino, e que as tropas do imperador dos francezes e rei de Italia sejam bem aquarteladas, e assistidas de tudo que lhes fôr preciso, em quanto se detiverem n'este reino, evitando todo e qualquer insulto, que se possa perpetrar, e castigando-o rigorosamente, quando aconteça; conservando sempre a boa harmonia, que se deve practicar com os exercitos das nações, com as quaes nos achâmos unidos no continente.Quando succeda, por qualquer modo, faltar algum dos ditos governadores elegerão á pluralidade de votos quem lhe succeda. Confio muito da sua honra e virtude, que os meus povos não soffrerão incommodo na minha ausencia, e que, permittindo Deus que volte a estes meus reinos com brevidade, encontre todos contentes, e satisfeitos, reinando sempre entre elles a boa ordem e tranquillidade, que deve haver entre vassallos, que tão dignos se tem feito do meu paternal cuidado.Palacio de Nossa Senhora da Ajuda em vinte e seis de novembro de mil oitocentos e sete.—Principe.N.º 6Decreto do Bonaparte impondo uma contribuiçãode guerra a PortugalNapoleão, etc., etc., temos ordenado e ordenâmos o seguinte:Artigo1.º Uma contribuição extraordinaria de guerra de cem milhões de francos[2]será lançada sobre o reino de Portugal pelo resgate das propriedades particulares, qualquer que seja a denominação d'ellas.Art.2.º Esta contribuição será repartida por provincias e concelhos, segundo os respectivos meios, o que ficará a cargo do general em chefe do nosso exercito, que dará todas as providencias para ser promptamente cobrada.Art.3.º Sequestrar-se-hão todos os bens pertencentes á rainha, ao principe regente, e aos demais principes que disfructarem qualquer apanagio.Art.4.º Serão egualmente sequestrados todos os bens dos que acompanharam o principe regente no acto de abandonar o paiz, se não regressarem ao reino até 15 de fevereiro de 1808.Dado no palacio real de Milão em 23 de dezembro de 1807.NAPOLEÃON.º 7A deputação portuguesa enviada junto a suamagestade o imperador dos franceses e reida Italia, protector da confederação doRheno, aos compatriotasA confiança que depositastes no grande principe, junto ao qual temos a honra de ser interpretes dos vossos sentimentos, e dos vossos votos, foi inspirada, menos pelo conhecimento dos interesses da patria, do que pelo desejo de confiar a decisão da nossa sorte ao poderoso genio, que, tendo restaurado o seu paiz, deu uma nova constituição á Europa.O tempo que nos demorámos na fronteira do imperio francez, e que precedeu a chegada de sua magestade imperial e real, cabalmente nos mostrou o imperio, que o grande monarcha exerce nos corações de todos.As acclamações cada vez mais vivas de seus subditos nos annunciaram o momento, em que devia completar-se a felicidade d'elles e começar a nossa.Sua magestade imperial e real concedeu o primeiro dia da sua chegada a Bayona aos seus subditos (este é o tributo ordinario do seu desvelo para com elles), e dignou-se conceder-nos o segundo. Sua magestade imperial e real conhecia, ainda mesmo antes de lh'as expormos, a vossa posição, as vossas necessidades e tudo quanto vos interessa. Se alguma cousa póde egualar o seu genio, é a elevação da sua alma e a generosidade dos seus principios.Ao passo, que sua magestade imperial e real se dignava falar-nos das nossas circumstancias politicas com affabilidade verdadeiramente paternal, fazia as reflexões mais interessantes ácerca da nossa felicidade, e manifestava os principios mais elevados a respeito do uso dos direitos que as circumstancias lhe deram. Não foi como conquistador que sua magestade imperial e real entrou no nosso territorio, nem como tal quer que o seu exercito ahi permaneça. O imperador sabe que nunca tivemos guerra com sua magestade imperial e real. Pela grande distancia, que separa a nossa patria do seu imperio, não póde sua magestade imperial e real vigiar sobre ella com a mesma attenção, com que vigia os outros Estados seus, e com que, satisfazendo a todas as necessidades d'elles satisfaz tambem o amor que sua magestade imperial e real consagra aos que têem a fortuna de ser seus subditos: seguem-se muitos inconvenientes da delegação de uma grande auctoridade em paizes mui distantes. Sua magestade imperial e real não nutre desejo algum de vingança, nem mostra rancor ao principe, que, nos governava, nem á sua real familia. Sua magestade imperial e real occupa-se de objectos mais nobres, e não tracta senão de nos ligar com as outras partes da Europa ao grande systema continental, do qual devemos fechar o ultimo annel: tracta de nos livrar da influencia estrangeira que nos dominou tantos annos: o imperador não póde consentir uma colonia ingleza no continente: o imperadornão póde nem quer deixar aportar a Portugal o principe, que o deixou, confiando-se na protecção de navios inglezes.Sua magestade imperial e real, considerando a vossa situação, houve por bem declarar-nos que a nossa sorte dependia de nós; isto é, do espirito publico que mostrassemos, com o qual nos unissemos ao systema geral do continente, e concorressemos para os acontecimentos já preparados, assim como da nossa vigilancia e da firmeza, com que repellissemos as sugestões e intrigas que são de esperar, e que, sem proveito real para os que forem auctores, ou objectos d'ellas só pódem causar a nossa desgraça. Estes são os signaes por onde sua magestade imperial e real quer julgar se somos ainda dignos de formar uma nação capaz de sustentar no throno o principe, que nos governar, e de occupar entre as nações o logar que nos compete, ou se, devemos ser confundidos com aquella, cuja posição mais se approxima de nós mas de quem tão grandes motivos nos afastam. Vereis com reconhecimento e admiração nestas sabias disposições os profundos conhecimentos de sua magestade imperial e real, que não quer decidir a sorte de um Estado, senão conforme os seus desejos manifestados por factos. Cumpre aos magistrados e ás pessoas mais auctorizadas que existem entre vós, cumpre a vós todos dar a maior publicidade ás beneficas intenções de sua magestade imperial e real. Esperâmos pois que confirmareis os protestos que lhe fizemos em vosso nome.Quando um grito unanime, arrancado no fundo dos nossos corações, mostrou o desejo que tinhamos de ser uma nação, então mais do que nunca nos julgámos dignos interpretes dos vossos sentimentos. O imperador, que depois de tantas tempestades soube fazer da sua patria o primeiro paiz do mundo, deverá conhecer que a nossa não merece ser o ultimo.Sua magestade imperial e real conhece as privações que a interrupção momentanea do commercio vos faz supportar: vosso estado a este respeito é o mesmo que o do resto da Europa e que o da America; é consequencia de uma lucta, cujo futuro resultado vos póde compensar os trabalhos do tempo actual; tambem não esqueceu a sua magestade imperial e real a coacção, em que vos poz a entrada de um exercito estrangeiro.O imperador deseja ardentemente prevenir que esta desgraça se renove.Affigiu assáz seu coração o pezo da contribuição que opprime Portugal: a sua bondade lhe dictou a promessa de a reduzir conforme fosse compativel com os nossos haveres. Os portuguezes, que estavam prisioneiros em França, graças á clemencia do imperador, gozam já da liberdade.Sua magestade imperial e real nos auctoriza para que vos participemos as suas intenções, certos que ellas excitarão em vós a maior gratidão e o mais sincero desejo de lhe corresponderdes.Continuaremos a preencher junto a sua magestade imperial e real, e conforme suas ordens, uma missão que não tem difficuldades, pois que a bondade do imperador se une á sua sabedoria para simplificar os nossos maiores interesses.Bayona, 27 da Abril de 1808—(assignados) marquez de Penalva—marquez de Marialva—D. Nuno Caetano Alvares Pereira de Mello—marquez de Valença—marquez de Abrantes—marquez de Abrantes, D. José—conde do Sabugal—Francisco, bispo de Coimbra—conde de Arganil—José, bispo, inquisidor geral—visconde de Barbacena—D. Lourenço de Lima—D. José, prior mór da ordem militar de S. Bento de Aviz—Joaquim Alberto Jorge—Antonio Thomaz da Silva Leitão.N.º 8Representação feita em Lisboa na junta dostres Estados pelos pseu-deputados detodas as classesOrdenando o general Junot que na junta dos tres Estados se ajuntassem os deputados de todas as ordens civis para expressarem o voto geral da nação, em consequencia do que a deputação portugueza havia communicado na sua carta escrita do Bayonna em 27 de abril de 1808, foram nomeados por esta conferencia secreta os seguintes:Pelo clero.O principal Miranda, decano. O principal Noronha, seu immediato.Pela nobreza.O conde de Peniche, que presidia noconselho de fazenda. D. Francisco Xavier de Noronha, presidente da meza da consciencia e ordens.Pela municipalidade e povo.O desembargador João José de Faria da Costa Abreu Guião, que presidia no senado da camara. O desembargador Luiz Coelho Ferreira Faria, seu immediato. O juiz do povo. O escrivão do povo.Pela ordem da magistratura.O desembargador Nicolau Esteves Negrão, chanceller mór do reino. O desembargador Lucas de Seabra da Silva, chanceller da caza da supplicação.Estes dez deputados, juntando-se aos da junta dos tres Estados, que então eram o conde da Ega, que presidia por ser titulo mais antigo, o conde de Almada, e o conde de Castro Marim filho, todos elles assim reunidos, formularam de commum accordo a seguinte representação:Senhor:—Os representantes da nação portugueza, conhecida nos annaes do mundo, e celebre, atrevemo-nos a dizêl-o, pelas suas conquistas e pela sua fidelidade, teem a honra de apresentar-se ao throno augusto de vossa magestade imperial e real.Os acontecimentos extraordinarios, senhor, que agitaram a Europa toda comprehenderam Portugal: uma politica mal entendida fez a esta nação victima innocente dos males que tem experimentado. A consideração dos interesses e relações que formam o presente systema federativo da Europa, e as disposições beneficas de vossa magestade para com Portugal, nos fazem conceber as mais lisongeiras esperanças de futura felicidade, accolhendo-nos debaixo da magnifica protecção do heroe do mundo, do arbitro dos reis e dos povos, que só póde cicatrizar as feridas da patria, defendel-a do perigo da escravidão, e dar-lhe, entre as potencias da Europa, aquelle logar distincto, que as profundas vistas politicas de vossa magestade lhe tem desde já, como esperâmos, designado. As circumstancias do tempo presente e a probabilidade do que ha de vir nos faz conceber a causa dos males que temos soffrido e o unico remedio a que devemos recorrer.Interpretes e depositarios dos votos da nação, em nome de toda ella rogâmos e aspirâmos a formar um dia parte da grande familia, de que vossa magestade é pae benefico e soberano poderoso, e nos lisongeâmos, senhor, que ella merece tal graça. Ninguem melhor doque o representante de vossa magestade, o general em chefe do exercito de Portugal, e com elle todo o seu exercito, póde dar maiores testemunhos do espirito publico, que anima uma nação, que apezar dos maiores sacrificios e privações, que as actuaes circumstancias lhe têem feito experimentar, nada foi capaz de a fazer afrouxar em os sentimentos de admiração, de respeito e de gratidão que todos nós professâmos a vossa magestade, antes pelo contrario a intriga, as insinuações d'aquelles que se oppõem ao nosso socego, e o pessimo exemplo dos nossos visinhos não fizeram mais do que augmentar estes mesmos sentimentos, desenvolvendo aquelle antigo germen de affeição, que sempre subsistiu entre estas duas nações, lembrando-se os portuguezes de que o seu primeiro soberano fôra o conde D. Henrique, principe francez.Achâmo-nos, pois, plenamente convencidos de que Portugal não póde conservar a sua independencia, animar a sua energia e o caracter de sua propria dignidade, sem recorrer ás benevolas disposições de vossa magestade. Ditosos seremos se vossa magestade nos considerar dignos de ser contados no numero de seus fieis vassallos; e quando pela nossa situação geographica, ou por outra qualquer razão, que a alta consideração de vossa magestade tenha concebido não possamos lograr esta felicidade, seja vossa magestade quem nos dê um principe da sua escolha, ao qual entregaremos, com inteira e respeitosa confiança, a defeza das nossas leis, dos nossos direitos, da nossa religião e de todos os mais sagrados interesses da patria.Debaixo dos auspicios da Providencia, debaixo da gloriosa protecção de vossa magestade e do governo tutelar, que respeitosa e unanimemente supplicâmos, nos lisongeâmos esperar, senhor, que Portugal assegurado para sempre da affeição do maior dos monarchas, e unido por uma mesma constituição politica aos destinos da França, verá renascer os ditosos dias da sua antiga grandeza; a sua prosperidade será solida como a vossa gloria, eterna como o vosso nome.Lisboa, 24 de maio de 1808.Copiada do Correio Braziliense—Vol. 13.º fl. 738.N. B.Foi esta mensagem assignada pelo conde da Ega, como presidente d'aquella commissão secreta, e bem assim por todos os titulares e mais fidalgos quese achavam em Lisboa, á excepção do marquez das Minas, o unico que a isso se recusou. Os signatarios de modo algum representavam a nação, com cujos interesses pouco se importavam; tinham apenas em mira obter de Napoleão a conservação das regalias e privilegios que Filippe II e D. João IV haviam confirmado a seus antepassados. AJunta dos Tres Estados, de que era presidente o conde da Ega, só tinha attribuições administrativas, não se parecendo em cousa alguma com as antigas côrtes do reino. O juiz do povo foi obrigado a assignar esta representação contra a qual havia a principio protestado.N.º 9Projecto para a constituição de PortugalLembrando-se os portuguezes, de que são de raça franceza, como descendentes dos que conquistaram este bello paiz aos mouros em 1147, e que devem á França, sua mãe patria, o beneficio da independencia que recobraram como nação em 1640, solicitos recorrem cheios de respeito e gratidão á paternal protecção que o maior dos monarchas ha por bem outorgar-lhes. Dignando se o immortal Napoleão patentear-nos a sua vontade por orgão de nossos deputados, quer que sejamos livres, e que nos liguemos com indissoluveis laços ao systema continental da familia europea, quer as nações, que compõem esta grande familia vivam unidas, e que prestes possam gosar das delicias de uma prolongada paz, á sombra dos sabios governos fundados nas grandes bazes da legislação e da liberdade maritima e commercial. É portanto do nosso peculiar interesse, assim como dos outros povos confederados, que a nossa deputação continue a ser junto a sua magestade imperial e real a interprete de nossos unanimes votos e que lhe diga:Senhor! desejamos ser ainda mais do que eramos quando abrimos o Oceano a todo o universo;Pedimos uma constituição e um rei constitucional, que seja principe de sangue de vossa imperial familia;Dar-nos-hemos por felizes se tivermos uma constituição em tudo similhante á que vossa magestade imperial e real houve por bem outorgar ao grão-ducado de Varsovia, com a unica differença de que os representantes da nação, sejam eleitos pelas camaras municipaes,a fim de nos conformarmos com nossos antigos usos;Queremos uma constituição, na qual, á similhança de Varsovia, a religião catholica, apostolica, romana seja a religião do Estado; em que sejam admittidos os principios da ultima concordata entre o imperio francez e a santa sede; pela qual sejam livres todos os cultos e gozem da tolerancia civil e de exercicio publico; em que todos os cidadãos sejam eguaes perante a lei; em que o nosso territorio europeu seja dividido em oito provincias, assim a respeito da jurisdicção ecclesiastica, como da civil, de maneira que só fique havendo um arcebispo e sete bispos; em que as nossas colonias, fundadas por nossos avós, e com o seu sangue banhadas, sejam consideradas como provincias, ou districtos, fazendo parte intregante do reino, para que seus representantes, desde já designados, achem em a nossa organização social os logares que lhes pertencem, logo que venham, ou possam vir occupal-os; em que haja um ministerio especial para dirigir e inspeccionar a instrucção publica; em que seja livre a imprensa, por quanto a ignorancia e o erro tem originado a nossa decadencia; em que o poder executivo seja assistido nas luzes de um conselho d'Estado, e não possa obrar senão por meio de ministros responsaveis; em que o poder legislativo seja exercido por duas camaras com a concorrencia da auctoridade executiva; em que o poder judicial seja independente, o codigo de Napoleão posto em vigor, e as sentenças proferidas com justiça, publicidade e promptidão; em que os empregos publicos sejam exclusivamente exercidos por nacionaes que melhor os merecerem, conforme o que se acha determinado no artigo 2.º da constituição polaca; em que os bens de mão morta sejam postos em circulação; em que os impostos sejam repartidos segundo as posses e fortuna de cada um sem excepção alguma de pessoa ou classe e da maneira que mais facil e menos oppressiva fôr para os contribuintes; em que toda a divida publica se consolide e garanta completamente visto, haver recursos para lhe fazer face.Queremos egualmente que a organização pessoal da administração civil, fiscal e judicial, seja conforme o systema francez, e por conseguinte se reduza o numero immenso de nossos funccionarios; mas desejâmose pedimos que todos os empregados que ficarem fóra dos quadros recebam sempre os ordenados, ou pelo menos uma proporcionada pensão,e que nas vacaturas tenham preferencia a outros quaesquer.Era sem duvida inutil lembrar esta medida de equidade ao grande Napoleão; mas como sua magestade imperial e real quer conhecer a nossa opinião em tudo o que nos convem, evidentemente nos prova que é mais pae do que soberano nosso, dignando-se consultar seus filhos, e prestar-lhes os meios de serem felizes.Viva o imperador!N.º 10
O duque de Abrantes mostrou-se digno dos feitos heroicos, que ennobreceram a sua carreira etc.pag. 68.
Tratado secreto concluido em Fontainebleauentre o imperador dos francezes eel-rei de Hespanha
Duroc.—E. Izquierdo.
NAPOLEÃO.
Champagny.
H. B. Marat.
O principe regente nosso senhor foi servido mandar remetter á mesa do desembargo do paço o decreto do teor seguinte.
O governador de Paris, primeiro ajudante de campo de sua magestade o imperador, e rei, general em chefe, grão-cruz da ordem de Christo de Portugal.
Instrucções a que se refere o meu real decretode 26 de novembro de 1807
Decreto do Bonaparte impondo uma contribuiçãode guerra a Portugal
NAPOLEÃO
A deputação portuguesa enviada junto a suamagestade o imperador dos franceses e reida Italia, protector da confederação doRheno, aos compatriotas
Representação feita em Lisboa na junta dostres Estados pelos pseu-deputados detodas as classes
Projecto para a constituição de Portugal