PARTE IIOS LYRICOS BRAZILEIROS
Na praia dezerta que a lua branqueia,Que mimo! que rosa, que filha de Deus!Tão pallida—ao vel-a meu sêr devaneia,Suffoco nos labios os halitos meus.Não corras na areia,Não corras assim!Donzella, onde vaes?Tem pena de mim.A praia é tão longa! e a onda braviaAs roupas de gaza te molha de escuma;De noite aos serenos—a areia é tão fria,Tão humido o vento que os áres perfuma!És tão doentia!Não corras assim!Donzella, onde vaes?Tem pena de mim.A brisa teus negros cabellos soltou,O orvalho da face te esfria o suor;Teus seios palpitam—a brisa os roçou,Beijou-os, suspira, desmaia de amor.Teu pé tropeçou...Não corras assim!Donzella, onde vaes?Tem pena de mim:E o pallido mimo da minha paixãoN'um longo soluço tremeu e parou;Sentou-se na praia; sósinha no chãoA mão regelada no collo pousou!Que tens, coração,Que tremes assim?Cansaste, donzella?Tem pena de mim.Deitou-se na areia que a vaga molhou,Immovel e branca na praia dormia;Mas nem os seus olhos o somno fechou,E nem o seu collo de neve tremia.O seio gelou?...Não durmas assim!Oh pallida fria,Tem pena de mim.Dormia—na fronte que niveo suár!Que mão regelada no languido peito!Não era mais alvo seu leito do mar,Não era mais frio seu gélido leito!Nem um resonar!...Não durmas assim!Oh pallida friaTem pena de mim.Aqui no meu peito vem antes sonhar,Nos longos suspiros do meu coração,Eu quero em meus labios teu seio aquentar,Teu collo, essas faces e a gélida mão!Não durmas no mar!Não durmas assimEstatua sem vida,Tem pena de mim!E a vaga crescia seu corpo banhando,As candidas formas movendo de leve!E eu via-a suave nas aguas boiando,Com soltos cabellos nas roupas de neve!Nas vagas sonhandoNão durmas assim;Donzella, onde vaes?Tem pena de mim!E a imagem da virgem nas aguas do marBrilhava tão branca no limpido véo!Nem mais transparente luzia o luarNo ambiente sem nuvens da noite do céo!Nas aguas do marNão durmas assim!Não morras, donzella,Espera por mim!M. A. Alvares de Azevedo,Obras, t. I, p. 67. Rio de Janeiro, 1862.
Na praia dezerta que a lua branqueia,Que mimo! que rosa, que filha de Deus!Tão pallida—ao vel-a meu sêr devaneia,Suffoco nos labios os halitos meus.Não corras na areia,Não corras assim!Donzella, onde vaes?Tem pena de mim.A praia é tão longa! e a onda braviaAs roupas de gaza te molha de escuma;De noite aos serenos—a areia é tão fria,Tão humido o vento que os áres perfuma!És tão doentia!Não corras assim!Donzella, onde vaes?Tem pena de mim.A brisa teus negros cabellos soltou,O orvalho da face te esfria o suor;Teus seios palpitam—a brisa os roçou,Beijou-os, suspira, desmaia de amor.Teu pé tropeçou...Não corras assim!Donzella, onde vaes?Tem pena de mim:E o pallido mimo da minha paixãoN'um longo soluço tremeu e parou;Sentou-se na praia; sósinha no chãoA mão regelada no collo pousou!Que tens, coração,Que tremes assim?Cansaste, donzella?Tem pena de mim.Deitou-se na areia que a vaga molhou,Immovel e branca na praia dormia;Mas nem os seus olhos o somno fechou,E nem o seu collo de neve tremia.O seio gelou?...Não durmas assim!Oh pallida fria,Tem pena de mim.Dormia—na fronte que niveo suár!Que mão regelada no languido peito!Não era mais alvo seu leito do mar,Não era mais frio seu gélido leito!Nem um resonar!...Não durmas assim!Oh pallida friaTem pena de mim.Aqui no meu peito vem antes sonhar,Nos longos suspiros do meu coração,Eu quero em meus labios teu seio aquentar,Teu collo, essas faces e a gélida mão!Não durmas no mar!Não durmas assimEstatua sem vida,Tem pena de mim!E a vaga crescia seu corpo banhando,As candidas formas movendo de leve!E eu via-a suave nas aguas boiando,Com soltos cabellos nas roupas de neve!Nas vagas sonhandoNão durmas assim;Donzella, onde vaes?Tem pena de mim!E a imagem da virgem nas aguas do marBrilhava tão branca no limpido véo!Nem mais transparente luzia o luarNo ambiente sem nuvens da noite do céo!Nas aguas do marNão durmas assim!Não morras, donzella,Espera por mim!M. A. Alvares de Azevedo,Obras, t. I, p. 67. Rio de Janeiro, 1862.
Na praia dezerta que a lua branqueia,Que mimo! que rosa, que filha de Deus!Tão pallida—ao vel-a meu sêr devaneia,Suffoco nos labios os halitos meus.Não corras na areia,Não corras assim!Donzella, onde vaes?Tem pena de mim.
Na praia dezerta que a lua branqueia,
Que mimo! que rosa, que filha de Deus!
Tão pallida—ao vel-a meu sêr devaneia,
Suffoco nos labios os halitos meus.
Não corras na areia,
Não corras assim!
Donzella, onde vaes?
Tem pena de mim.
A praia é tão longa! e a onda braviaAs roupas de gaza te molha de escuma;De noite aos serenos—a areia é tão fria,Tão humido o vento que os áres perfuma!És tão doentia!Não corras assim!Donzella, onde vaes?Tem pena de mim.
A praia é tão longa! e a onda bravia
As roupas de gaza te molha de escuma;
De noite aos serenos—a areia é tão fria,
Tão humido o vento que os áres perfuma!
És tão doentia!
Não corras assim!
Donzella, onde vaes?
Tem pena de mim.
A brisa teus negros cabellos soltou,O orvalho da face te esfria o suor;Teus seios palpitam—a brisa os roçou,Beijou-os, suspira, desmaia de amor.Teu pé tropeçou...Não corras assim!Donzella, onde vaes?Tem pena de mim:
A brisa teus negros cabellos soltou,
O orvalho da face te esfria o suor;
Teus seios palpitam—a brisa os roçou,
Beijou-os, suspira, desmaia de amor.
Teu pé tropeçou...
Não corras assim!
Donzella, onde vaes?
Tem pena de mim:
E o pallido mimo da minha paixãoN'um longo soluço tremeu e parou;Sentou-se na praia; sósinha no chãoA mão regelada no collo pousou!Que tens, coração,Que tremes assim?Cansaste, donzella?Tem pena de mim.
E o pallido mimo da minha paixão
N'um longo soluço tremeu e parou;
Sentou-se na praia; sósinha no chão
A mão regelada no collo pousou!
Que tens, coração,
Que tremes assim?
Cansaste, donzella?
Tem pena de mim.
Deitou-se na areia que a vaga molhou,Immovel e branca na praia dormia;Mas nem os seus olhos o somno fechou,E nem o seu collo de neve tremia.O seio gelou?...Não durmas assim!Oh pallida fria,Tem pena de mim.
Deitou-se na areia que a vaga molhou,
Immovel e branca na praia dormia;
Mas nem os seus olhos o somno fechou,
E nem o seu collo de neve tremia.
O seio gelou?...
Não durmas assim!
Oh pallida fria,
Tem pena de mim.
Dormia—na fronte que niveo suár!Que mão regelada no languido peito!Não era mais alvo seu leito do mar,Não era mais frio seu gélido leito!Nem um resonar!...Não durmas assim!Oh pallida friaTem pena de mim.
Dormia—na fronte que niveo suár!
Que mão regelada no languido peito!
Não era mais alvo seu leito do mar,
Não era mais frio seu gélido leito!
Nem um resonar!...
Não durmas assim!
Oh pallida fria
Tem pena de mim.
Aqui no meu peito vem antes sonhar,Nos longos suspiros do meu coração,Eu quero em meus labios teu seio aquentar,Teu collo, essas faces e a gélida mão!Não durmas no mar!Não durmas assimEstatua sem vida,Tem pena de mim!
Aqui no meu peito vem antes sonhar,
Nos longos suspiros do meu coração,
Eu quero em meus labios teu seio aquentar,
Teu collo, essas faces e a gélida mão!
Não durmas no mar!
Não durmas assim
Estatua sem vida,
Tem pena de mim!
E a vaga crescia seu corpo banhando,As candidas formas movendo de leve!E eu via-a suave nas aguas boiando,Com soltos cabellos nas roupas de neve!Nas vagas sonhandoNão durmas assim;Donzella, onde vaes?Tem pena de mim!
E a vaga crescia seu corpo banhando,
As candidas formas movendo de leve!
E eu via-a suave nas aguas boiando,
Com soltos cabellos nas roupas de neve!
Nas vagas sonhando
Não durmas assim;
Donzella, onde vaes?
Tem pena de mim!
E a imagem da virgem nas aguas do marBrilhava tão branca no limpido véo!Nem mais transparente luzia o luarNo ambiente sem nuvens da noite do céo!Nas aguas do marNão durmas assim!Não morras, donzella,Espera por mim!
E a imagem da virgem nas aguas do mar
Brilhava tão branca no limpido véo!
Nem mais transparente luzia o luar
No ambiente sem nuvens da noite do céo!
Nas aguas do mar
Não durmas assim!
Não morras, donzella,
Espera por mim!
M. A. Alvares de Azevedo,Obras, t. I, p. 67. Rio de Janeiro, 1862.
M. A. Alvares de Azevedo,Obras, t. I, p. 67. Rio de Janeiro, 1862.
Pallida, á luz da lampada sombria,Sobre o leito de flores reclinada,Como a lua por noite embalsamada,Entre as nuvens do mar ella dormia!Era a virgem do mar, na escuma friaPela maré das aguas embalada!Era um anjo entre nuvens d'alvoradaQue em sonhos se banhava e se esquecia!Era mais bella! o seio palpitando...Negros olhos as palpebras abrindo...Fórmas núas no leito resvalando...Não te rias de mim, meu anjo lindo!Por ti—as noites eu velei chorando,Por ti—nos sonhos morrerei sorrindo!Alvares de Azevedo,Ibid.t. I, p. 131.
Pallida, á luz da lampada sombria,Sobre o leito de flores reclinada,Como a lua por noite embalsamada,Entre as nuvens do mar ella dormia!Era a virgem do mar, na escuma friaPela maré das aguas embalada!Era um anjo entre nuvens d'alvoradaQue em sonhos se banhava e se esquecia!Era mais bella! o seio palpitando...Negros olhos as palpebras abrindo...Fórmas núas no leito resvalando...Não te rias de mim, meu anjo lindo!Por ti—as noites eu velei chorando,Por ti—nos sonhos morrerei sorrindo!Alvares de Azevedo,Ibid.t. I, p. 131.
Pallida, á luz da lampada sombria,Sobre o leito de flores reclinada,Como a lua por noite embalsamada,Entre as nuvens do mar ella dormia!
Pallida, á luz da lampada sombria,
Sobre o leito de flores reclinada,
Como a lua por noite embalsamada,
Entre as nuvens do mar ella dormia!
Era a virgem do mar, na escuma friaPela maré das aguas embalada!Era um anjo entre nuvens d'alvoradaQue em sonhos se banhava e se esquecia!
Era a virgem do mar, na escuma fria
Pela maré das aguas embalada!
Era um anjo entre nuvens d'alvorada
Que em sonhos se banhava e se esquecia!
Era mais bella! o seio palpitando...Negros olhos as palpebras abrindo...Fórmas núas no leito resvalando...
Era mais bella! o seio palpitando...
Negros olhos as palpebras abrindo...
Fórmas núas no leito resvalando...
Não te rias de mim, meu anjo lindo!Por ti—as noites eu velei chorando,Por ti—nos sonhos morrerei sorrindo!
Não te rias de mim, meu anjo lindo!
Por ti—as noites eu velei chorando,
Por ti—nos sonhos morrerei sorrindo!
Alvares de Azevedo,Ibid.t. I, p. 131.
Alvares de Azevedo,Ibid.t. I, p. 131.
Quando em meu peito rebentar-se a fibraQue o espirito enlaça á dor vivente,Não derramem por mim nem uma lagrima,Em palpebra demente.E nem desfolhem na materia impuraA flor do valle que adormece ao vento:Não quero que uma nota de alegriaSe cale por meu triste passamento.Eu deixo a vida como deixa o tedioDo deserto, o poente caminheiro,—Como as horas do meu longo pesadelloQue se desfaz ao dobre de um sineiro;Como um desterro da minh'alma errante,Onde fogo insensato a consummia;Só levo uma saudade—é d'esses temposQue amorosa illusão embellecia.Só levo uma saudade—é d'essas sombrasQue eu sentia velar nas noites minhas...De ti, oh minha mãe, pobre coitada,Que por minha tristeza te definhas!De meu pae... de meus unicos amigos,Poucos—bem poucos—e que não zombavamQuanto, em noites de febre endoidecido.Minhas pallidas crenças duvidavam.Se uma lagrima as palpebras me inunda,Se um suspiro nos seios treme aindaÉ pela virgem que sonhei... que nuncaAos labios me encostou a face linda!Só tu á mocidade sonhadoraDo pallido poeta déste flores...Se viveu, foi por ti! e de esperançaDe na vida gosar de teus amores.Beijarei a verdade santa e núa,Verei cristallisar-se o sonho amigo...Oh minha virgem dos errantes sonhos,Filha do céo, eu vou viver comtigo.Descancem o meu leito solitarioNa floresta dos homens esquecida,Á sombra de uma cruz, e escrevam n'ella:—Foi poeta—sonhou—e amou na vida.Sombras do valle, noites da montanha,Que minha alma cantou e amava tanto,Protegei o meu corpo abandonado,E no silencio derramae-lhe canto!Mas quando preludia ave d'auroraE quando á meia noite o céo repousa,Arvoredos do bosque, abri os ramos...Deixae a lua pratear-me a lousa.Alvares de Azevedo,Ibid.t. I. pag. 198.
Quando em meu peito rebentar-se a fibraQue o espirito enlaça á dor vivente,Não derramem por mim nem uma lagrima,Em palpebra demente.E nem desfolhem na materia impuraA flor do valle que adormece ao vento:Não quero que uma nota de alegriaSe cale por meu triste passamento.Eu deixo a vida como deixa o tedioDo deserto, o poente caminheiro,—Como as horas do meu longo pesadelloQue se desfaz ao dobre de um sineiro;Como um desterro da minh'alma errante,Onde fogo insensato a consummia;Só levo uma saudade—é d'esses temposQue amorosa illusão embellecia.Só levo uma saudade—é d'essas sombrasQue eu sentia velar nas noites minhas...De ti, oh minha mãe, pobre coitada,Que por minha tristeza te definhas!De meu pae... de meus unicos amigos,Poucos—bem poucos—e que não zombavamQuanto, em noites de febre endoidecido.Minhas pallidas crenças duvidavam.Se uma lagrima as palpebras me inunda,Se um suspiro nos seios treme aindaÉ pela virgem que sonhei... que nuncaAos labios me encostou a face linda!Só tu á mocidade sonhadoraDo pallido poeta déste flores...Se viveu, foi por ti! e de esperançaDe na vida gosar de teus amores.Beijarei a verdade santa e núa,Verei cristallisar-se o sonho amigo...Oh minha virgem dos errantes sonhos,Filha do céo, eu vou viver comtigo.Descancem o meu leito solitarioNa floresta dos homens esquecida,Á sombra de uma cruz, e escrevam n'ella:—Foi poeta—sonhou—e amou na vida.Sombras do valle, noites da montanha,Que minha alma cantou e amava tanto,Protegei o meu corpo abandonado,E no silencio derramae-lhe canto!Mas quando preludia ave d'auroraE quando á meia noite o céo repousa,Arvoredos do bosque, abri os ramos...Deixae a lua pratear-me a lousa.Alvares de Azevedo,Ibid.t. I. pag. 198.
Quando em meu peito rebentar-se a fibraQue o espirito enlaça á dor vivente,Não derramem por mim nem uma lagrima,Em palpebra demente.
Quando em meu peito rebentar-se a fibra
Que o espirito enlaça á dor vivente,
Não derramem por mim nem uma lagrima,
Em palpebra demente.
E nem desfolhem na materia impuraA flor do valle que adormece ao vento:Não quero que uma nota de alegriaSe cale por meu triste passamento.
E nem desfolhem na materia impura
A flor do valle que adormece ao vento:
Não quero que uma nota de alegria
Se cale por meu triste passamento.
Eu deixo a vida como deixa o tedioDo deserto, o poente caminheiro,—Como as horas do meu longo pesadelloQue se desfaz ao dobre de um sineiro;
Eu deixo a vida como deixa o tedio
Do deserto, o poente caminheiro,
—Como as horas do meu longo pesadello
Que se desfaz ao dobre de um sineiro;
Como um desterro da minh'alma errante,Onde fogo insensato a consummia;Só levo uma saudade—é d'esses temposQue amorosa illusão embellecia.
Como um desterro da minh'alma errante,
Onde fogo insensato a consummia;
Só levo uma saudade—é d'esses tempos
Que amorosa illusão embellecia.
Só levo uma saudade—é d'essas sombrasQue eu sentia velar nas noites minhas...De ti, oh minha mãe, pobre coitada,Que por minha tristeza te definhas!
Só levo uma saudade—é d'essas sombras
Que eu sentia velar nas noites minhas...
De ti, oh minha mãe, pobre coitada,
Que por minha tristeza te definhas!
De meu pae... de meus unicos amigos,Poucos—bem poucos—e que não zombavamQuanto, em noites de febre endoidecido.Minhas pallidas crenças duvidavam.
De meu pae... de meus unicos amigos,
Poucos—bem poucos—e que não zombavam
Quanto, em noites de febre endoidecido.
Minhas pallidas crenças duvidavam.
Se uma lagrima as palpebras me inunda,Se um suspiro nos seios treme aindaÉ pela virgem que sonhei... que nuncaAos labios me encostou a face linda!
Se uma lagrima as palpebras me inunda,
Se um suspiro nos seios treme ainda
É pela virgem que sonhei... que nunca
Aos labios me encostou a face linda!
Só tu á mocidade sonhadoraDo pallido poeta déste flores...Se viveu, foi por ti! e de esperançaDe na vida gosar de teus amores.
Só tu á mocidade sonhadora
Do pallido poeta déste flores...
Se viveu, foi por ti! e de esperança
De na vida gosar de teus amores.
Beijarei a verdade santa e núa,Verei cristallisar-se o sonho amigo...Oh minha virgem dos errantes sonhos,Filha do céo, eu vou viver comtigo.
Beijarei a verdade santa e núa,
Verei cristallisar-se o sonho amigo...
Oh minha virgem dos errantes sonhos,
Filha do céo, eu vou viver comtigo.
Descancem o meu leito solitarioNa floresta dos homens esquecida,Á sombra de uma cruz, e escrevam n'ella:—Foi poeta—sonhou—e amou na vida.
Descancem o meu leito solitario
Na floresta dos homens esquecida,
Á sombra de uma cruz, e escrevam n'ella:
—Foi poeta—sonhou—e amou na vida.
Sombras do valle, noites da montanha,Que minha alma cantou e amava tanto,Protegei o meu corpo abandonado,E no silencio derramae-lhe canto!
Sombras do valle, noites da montanha,
Que minha alma cantou e amava tanto,
Protegei o meu corpo abandonado,
E no silencio derramae-lhe canto!
Mas quando preludia ave d'auroraE quando á meia noite o céo repousa,Arvoredos do bosque, abri os ramos...Deixae a lua pratear-me a lousa.
Mas quando preludia ave d'aurora
E quando á meia noite o céo repousa,
Arvoredos do bosque, abri os ramos...
Deixae a lua pratear-me a lousa.
Alvares de Azevedo,Ibid.t. I. pag. 198.
Alvares de Azevedo,Ibid.t. I. pag. 198.
A vida é uma comedia sem sentido,Uma historia de sangue e de poeira,Um deserto sem luz...A escara de uma lava em craneo ardido...E depois sobre o lodo... uma caveira,Uns ossos e uma cruz!Parece que uma atroz fatalidadeA mente insana no provir alentaE zomba da illudida!O frio vendaval da eternidadeApaga sobre a fronte macilentaA lampada da vida.Não digas, coração, que alma descançaQuando as ideias no prazer enfurdaO escarneo zombeteiro...Que loucura!... a manhã o peito cansa,Resta um enterro... e uma resa surda...E depois... o coveiro!Fermente a seiba juvenil do peito,Vele o talento n'uma fronte santaQue o genio empallidece...Embalde! á noite, ao pé de cada leitoO phantasma terrivel se levanta...E seu bafo entorpece!E comtudo essa morte é um segredoQue gela as mãos do trovador na lyraE escarnece da crença;Um pesadêllo—uma visão de medo...Verdade que parece uma mentiraE inocula a descrença!E quem sabe? é a duvida medonha!Quem os véos arregaça do infinitoE os tumulos destampa?Quem, quando dorme, ou vela, ou quando sonhaOuviu revelações no horrendo gritoA rebentar da campa?E quem sabe? é a duvida terrivel:É a larva que aos labios nos apertaEntreabrindo o sudario!A realidade é um pesadêllo incrivel!Semelha um sonho a lápida desertaE o leito mortuario!E quando acordarão os que dormitam?Quando estas cinzas se erguerão tremendoEm nuvens se expandindo?Perguntae-o aos cyprestes que se agitam,Ao vento pela treva se escondendo,Nas ruinas bramindo!E comtudo parece um desvario,Blasphemia atroz o cantico atrevidoQue rugem os atheus;Sem a sombra de Deus é tão vasioO mundo—cemiterio envilecido!...Oh! creiamos em Deus!Creiamos, sim; ao menos para a vidaNão mergulhar-se n'uma noite escura...E não enlouquecer...Utopia ou verdade, a alma perdidaPrecisa de uma ideia eterna e pura—Deus e céo... para crêr.Consola-te! nós somos condemnadosÁ noite de amargura: o vento norteNossos pharoes apaga...Iremos todos, pobres naufragados,Frios rolar no littoral da morteRepellidos da vaga!Alvares de Azevedo,Ibid., t. I, p. 335.
A vida é uma comedia sem sentido,Uma historia de sangue e de poeira,Um deserto sem luz...A escara de uma lava em craneo ardido...E depois sobre o lodo... uma caveira,Uns ossos e uma cruz!Parece que uma atroz fatalidadeA mente insana no provir alentaE zomba da illudida!O frio vendaval da eternidadeApaga sobre a fronte macilentaA lampada da vida.Não digas, coração, que alma descançaQuando as ideias no prazer enfurdaO escarneo zombeteiro...Que loucura!... a manhã o peito cansa,Resta um enterro... e uma resa surda...E depois... o coveiro!Fermente a seiba juvenil do peito,Vele o talento n'uma fronte santaQue o genio empallidece...Embalde! á noite, ao pé de cada leitoO phantasma terrivel se levanta...E seu bafo entorpece!E comtudo essa morte é um segredoQue gela as mãos do trovador na lyraE escarnece da crença;Um pesadêllo—uma visão de medo...Verdade que parece uma mentiraE inocula a descrença!E quem sabe? é a duvida medonha!Quem os véos arregaça do infinitoE os tumulos destampa?Quem, quando dorme, ou vela, ou quando sonhaOuviu revelações no horrendo gritoA rebentar da campa?E quem sabe? é a duvida terrivel:É a larva que aos labios nos apertaEntreabrindo o sudario!A realidade é um pesadêllo incrivel!Semelha um sonho a lápida desertaE o leito mortuario!E quando acordarão os que dormitam?Quando estas cinzas se erguerão tremendoEm nuvens se expandindo?Perguntae-o aos cyprestes que se agitam,Ao vento pela treva se escondendo,Nas ruinas bramindo!E comtudo parece um desvario,Blasphemia atroz o cantico atrevidoQue rugem os atheus;Sem a sombra de Deus é tão vasioO mundo—cemiterio envilecido!...Oh! creiamos em Deus!Creiamos, sim; ao menos para a vidaNão mergulhar-se n'uma noite escura...E não enlouquecer...Utopia ou verdade, a alma perdidaPrecisa de uma ideia eterna e pura—Deus e céo... para crêr.Consola-te! nós somos condemnadosÁ noite de amargura: o vento norteNossos pharoes apaga...Iremos todos, pobres naufragados,Frios rolar no littoral da morteRepellidos da vaga!Alvares de Azevedo,Ibid., t. I, p. 335.
A vida é uma comedia sem sentido,Uma historia de sangue e de poeira,Um deserto sem luz...A escara de uma lava em craneo ardido...E depois sobre o lodo... uma caveira,Uns ossos e uma cruz!
A vida é uma comedia sem sentido,
Uma historia de sangue e de poeira,
Um deserto sem luz...
A escara de uma lava em craneo ardido...
E depois sobre o lodo... uma caveira,
Uns ossos e uma cruz!
Parece que uma atroz fatalidadeA mente insana no provir alentaE zomba da illudida!O frio vendaval da eternidadeApaga sobre a fronte macilentaA lampada da vida.
Parece que uma atroz fatalidade
A mente insana no provir alenta
E zomba da illudida!
O frio vendaval da eternidade
Apaga sobre a fronte macilenta
A lampada da vida.
Não digas, coração, que alma descançaQuando as ideias no prazer enfurdaO escarneo zombeteiro...Que loucura!... a manhã o peito cansa,Resta um enterro... e uma resa surda...E depois... o coveiro!
Não digas, coração, que alma descança
Quando as ideias no prazer enfurda
O escarneo zombeteiro...
Que loucura!... a manhã o peito cansa,
Resta um enterro... e uma resa surda...
E depois... o coveiro!
Fermente a seiba juvenil do peito,Vele o talento n'uma fronte santaQue o genio empallidece...Embalde! á noite, ao pé de cada leitoO phantasma terrivel se levanta...E seu bafo entorpece!
Fermente a seiba juvenil do peito,
Vele o talento n'uma fronte santa
Que o genio empallidece...
Embalde! á noite, ao pé de cada leito
O phantasma terrivel se levanta...
E seu bafo entorpece!
E comtudo essa morte é um segredoQue gela as mãos do trovador na lyraE escarnece da crença;Um pesadêllo—uma visão de medo...Verdade que parece uma mentiraE inocula a descrença!
E comtudo essa morte é um segredo
Que gela as mãos do trovador na lyra
E escarnece da crença;
Um pesadêllo—uma visão de medo...
Verdade que parece uma mentira
E inocula a descrença!
E quem sabe? é a duvida medonha!Quem os véos arregaça do infinitoE os tumulos destampa?Quem, quando dorme, ou vela, ou quando sonhaOuviu revelações no horrendo gritoA rebentar da campa?
E quem sabe? é a duvida medonha!
Quem os véos arregaça do infinito
E os tumulos destampa?
Quem, quando dorme, ou vela, ou quando sonha
Ouviu revelações no horrendo grito
A rebentar da campa?
E quem sabe? é a duvida terrivel:É a larva que aos labios nos apertaEntreabrindo o sudario!A realidade é um pesadêllo incrivel!Semelha um sonho a lápida desertaE o leito mortuario!
E quem sabe? é a duvida terrivel:
É a larva que aos labios nos aperta
Entreabrindo o sudario!
A realidade é um pesadêllo incrivel!
Semelha um sonho a lápida deserta
E o leito mortuario!
E quando acordarão os que dormitam?Quando estas cinzas se erguerão tremendoEm nuvens se expandindo?Perguntae-o aos cyprestes que se agitam,Ao vento pela treva se escondendo,Nas ruinas bramindo!
E quando acordarão os que dormitam?
Quando estas cinzas se erguerão tremendo
Em nuvens se expandindo?
Perguntae-o aos cyprestes que se agitam,
Ao vento pela treva se escondendo,
Nas ruinas bramindo!
E comtudo parece um desvario,Blasphemia atroz o cantico atrevidoQue rugem os atheus;Sem a sombra de Deus é tão vasioO mundo—cemiterio envilecido!...Oh! creiamos em Deus!
E comtudo parece um desvario,
Blasphemia atroz o cantico atrevido
Que rugem os atheus;
Sem a sombra de Deus é tão vasio
O mundo—cemiterio envilecido!...
Oh! creiamos em Deus!
Creiamos, sim; ao menos para a vidaNão mergulhar-se n'uma noite escura...E não enlouquecer...Utopia ou verdade, a alma perdidaPrecisa de uma ideia eterna e pura—Deus e céo... para crêr.
Creiamos, sim; ao menos para a vida
Não mergulhar-se n'uma noite escura...
E não enlouquecer...
Utopia ou verdade, a alma perdida
Precisa de uma ideia eterna e pura
—Deus e céo... para crêr.
Consola-te! nós somos condemnadosÁ noite de amargura: o vento norteNossos pharoes apaga...Iremos todos, pobres naufragados,Frios rolar no littoral da morteRepellidos da vaga!
Consola-te! nós somos condemnados
Á noite de amargura: o vento norte
Nossos pharoes apaga...
Iremos todos, pobres naufragados,
Frios rolar no littoral da morte
Repellidos da vaga!
Alvares de Azevedo,Ibid., t. I, p. 335.
Alvares de Azevedo,Ibid., t. I, p. 335.
Avidaé uma planta mysteriosaCheia de espinhos, negra de amarguras,Onde só abrem duas flôres purasPoesia e Amor...E amulher... é a nota suspirosaQue treme d'alma a corda estremecida,—É fada que nos leva alem da vidaPallidos de languor!Apoesiaé a luz da mocidade,O amor é o poema dos sentidos;A febre dos momentos não dormidosE o sonhar da ventura...Voltae, sonhos de amor e de saudade!Quero ainda sentir arder-me o sangue,Os olhos turvos, o meu peito langue,E morrer de ternura.Alvares de Azevedo,Ibid., t. III, p. 47.
Avidaé uma planta mysteriosaCheia de espinhos, negra de amarguras,Onde só abrem duas flôres purasPoesia e Amor...E amulher... é a nota suspirosaQue treme d'alma a corda estremecida,—É fada que nos leva alem da vidaPallidos de languor!Apoesiaé a luz da mocidade,O amor é o poema dos sentidos;A febre dos momentos não dormidosE o sonhar da ventura...Voltae, sonhos de amor e de saudade!Quero ainda sentir arder-me o sangue,Os olhos turvos, o meu peito langue,E morrer de ternura.Alvares de Azevedo,Ibid., t. III, p. 47.
Avidaé uma planta mysteriosaCheia de espinhos, negra de amarguras,Onde só abrem duas flôres purasPoesia e Amor...
Avidaé uma planta mysteriosa
Cheia de espinhos, negra de amarguras,
Onde só abrem duas flôres puras
Poesia e Amor...
E amulher... é a nota suspirosaQue treme d'alma a corda estremecida,—É fada que nos leva alem da vidaPallidos de languor!
E amulher... é a nota suspirosa
Que treme d'alma a corda estremecida,
—É fada que nos leva alem da vida
Pallidos de languor!
Apoesiaé a luz da mocidade,O amor é o poema dos sentidos;A febre dos momentos não dormidosE o sonhar da ventura...
Apoesiaé a luz da mocidade,
O amor é o poema dos sentidos;
A febre dos momentos não dormidos
E o sonhar da ventura...
Voltae, sonhos de amor e de saudade!Quero ainda sentir arder-me o sangue,Os olhos turvos, o meu peito langue,E morrer de ternura.
Voltae, sonhos de amor e de saudade!
Quero ainda sentir arder-me o sangue,
Os olhos turvos, o meu peito langue,
E morrer de ternura.
Alvares de Azevedo,Ibid., t. III, p. 47.
Alvares de Azevedo,Ibid., t. III, p. 47.
Se eu morresse ámanhã, viria ao menosFechar meus olhos minha triste irmã;Minha mãe de saudades morreria,Se eu morresse amanhã!Quanta gloria presinto em meu futuro!Que aurora de porvir e que manhã!Eu perdera chorando essas corôasSe eu morresse ámanhã!Que sol! que céo azul! que doce n'alvaAcorda a natureza mais louçã!Não me batera tanto amor no peito,Se eu morresse ámanhã!Mas essa dôr da vida que devoraA ancia de gloria, o dolorido afan...A dor no peito emudecera ao menos,Se eu morresse ámanhã!Alvares de Azevedo,Ibid., t. I, p. 343.
Se eu morresse ámanhã, viria ao menosFechar meus olhos minha triste irmã;Minha mãe de saudades morreria,Se eu morresse amanhã!Quanta gloria presinto em meu futuro!Que aurora de porvir e que manhã!Eu perdera chorando essas corôasSe eu morresse ámanhã!Que sol! que céo azul! que doce n'alvaAcorda a natureza mais louçã!Não me batera tanto amor no peito,Se eu morresse ámanhã!Mas essa dôr da vida que devoraA ancia de gloria, o dolorido afan...A dor no peito emudecera ao menos,Se eu morresse ámanhã!Alvares de Azevedo,Ibid., t. I, p. 343.
Se eu morresse ámanhã, viria ao menosFechar meus olhos minha triste irmã;Minha mãe de saudades morreria,Se eu morresse amanhã!
Se eu morresse ámanhã, viria ao menos
Fechar meus olhos minha triste irmã;
Minha mãe de saudades morreria,
Se eu morresse amanhã!
Quanta gloria presinto em meu futuro!Que aurora de porvir e que manhã!Eu perdera chorando essas corôasSe eu morresse ámanhã!
Quanta gloria presinto em meu futuro!
Que aurora de porvir e que manhã!
Eu perdera chorando essas corôas
Se eu morresse ámanhã!
Que sol! que céo azul! que doce n'alvaAcorda a natureza mais louçã!Não me batera tanto amor no peito,Se eu morresse ámanhã!
Que sol! que céo azul! que doce n'alva
Acorda a natureza mais louçã!
Não me batera tanto amor no peito,
Se eu morresse ámanhã!
Mas essa dôr da vida que devoraA ancia de gloria, o dolorido afan...A dor no peito emudecera ao menos,Se eu morresse ámanhã!
Mas essa dôr da vida que devora
A ancia de gloria, o dolorido afan...
A dor no peito emudecera ao menos,
Se eu morresse ámanhã!
Alvares de Azevedo,Ibid., t. I, p. 343.
Alvares de Azevedo,Ibid., t. I, p. 343.
Hontem no baileNão me attendias!Não me attendiasQuando eu fallava.De mim bem longeTeu pensamento!Teu pensamentoBem longe errava.Eu vi teus olhosSobre outros olhos,Sobre outros olhosQue eu odiava.Tu lhe sorristeCom tal sorriso!Com tal sorrisoQue apunhalava.Tu lhe fallasteCom voz tão doce!Com voz tão doceQue me matava.Oh não lhe fallesNão lhe sorrias,Se então queriasExperimentar-me.Oh não lhe fallesNão lhe sorrias,Não lhe sorriasQue era matar-me.A. Gonçalves Dias,Cantos, p. 22. Leipzic, 1860.
Hontem no baileNão me attendias!Não me attendiasQuando eu fallava.De mim bem longeTeu pensamento!Teu pensamentoBem longe errava.Eu vi teus olhosSobre outros olhos,Sobre outros olhosQue eu odiava.Tu lhe sorristeCom tal sorriso!Com tal sorrisoQue apunhalava.Tu lhe fallasteCom voz tão doce!Com voz tão doceQue me matava.Oh não lhe fallesNão lhe sorrias,Se então queriasExperimentar-me.Oh não lhe fallesNão lhe sorrias,Não lhe sorriasQue era matar-me.A. Gonçalves Dias,Cantos, p. 22. Leipzic, 1860.
Hontem no baileNão me attendias!Não me attendiasQuando eu fallava.
Hontem no baile
Não me attendias!
Não me attendias
Quando eu fallava.
De mim bem longeTeu pensamento!Teu pensamentoBem longe errava.
De mim bem longe
Teu pensamento!
Teu pensamento
Bem longe errava.
Eu vi teus olhosSobre outros olhos,Sobre outros olhosQue eu odiava.
Eu vi teus olhos
Sobre outros olhos,
Sobre outros olhos
Que eu odiava.
Tu lhe sorristeCom tal sorriso!Com tal sorrisoQue apunhalava.
Tu lhe sorriste
Com tal sorriso!
Com tal sorriso
Que apunhalava.
Tu lhe fallasteCom voz tão doce!Com voz tão doceQue me matava.
Tu lhe fallaste
Com voz tão doce!
Com voz tão doce
Que me matava.
Oh não lhe fallesNão lhe sorrias,Se então queriasExperimentar-me.
Oh não lhe falles
Não lhe sorrias,
Se então querias
Experimentar-me.
Oh não lhe fallesNão lhe sorrias,Não lhe sorriasQue era matar-me.
Oh não lhe falles
Não lhe sorrias,
Não lhe sorrias
Que era matar-me.
A. Gonçalves Dias,Cantos, p. 22. Leipzic, 1860.
A. Gonçalves Dias,Cantos, p. 22. Leipzic, 1860.
Se me queres a teus pés ajoelhado,Ufano de me vêr por ti rendido,Ou já em mudas lagrimas banhado;Volve, impiedosa,Volve-me os olhos,Basta uma vez!Se me queres de rojo sobre a terra,,Beijando a fimbria dos vestidos teus,Calando as queixas que meu peito encerra,Dize-me, ingrata,Dize-me: Eu quero!Basta uma vez.Mas se antes folgas de me ouvir na lyraLouvor singelo dos amores meus,Porque minha alma ha tanto em vão suspira;Dize-me, oh bella,Dize-me: Eu te amo!Basta uma vez.Gonçalves Dias,Ib., p. 117.
Se me queres a teus pés ajoelhado,Ufano de me vêr por ti rendido,Ou já em mudas lagrimas banhado;Volve, impiedosa,Volve-me os olhos,Basta uma vez!Se me queres de rojo sobre a terra,,Beijando a fimbria dos vestidos teus,Calando as queixas que meu peito encerra,Dize-me, ingrata,Dize-me: Eu quero!Basta uma vez.Mas se antes folgas de me ouvir na lyraLouvor singelo dos amores meus,Porque minha alma ha tanto em vão suspira;Dize-me, oh bella,Dize-me: Eu te amo!Basta uma vez.Gonçalves Dias,Ib., p. 117.
Se me queres a teus pés ajoelhado,Ufano de me vêr por ti rendido,Ou já em mudas lagrimas banhado;Volve, impiedosa,Volve-me os olhos,Basta uma vez!
Se me queres a teus pés ajoelhado,
Ufano de me vêr por ti rendido,
Ou já em mudas lagrimas banhado;
Volve, impiedosa,
Volve-me os olhos,
Basta uma vez!
Se me queres de rojo sobre a terra,,Beijando a fimbria dos vestidos teus,Calando as queixas que meu peito encerra,Dize-me, ingrata,Dize-me: Eu quero!Basta uma vez.
Se me queres de rojo sobre a terra,,
Beijando a fimbria dos vestidos teus,
Calando as queixas que meu peito encerra,
Dize-me, ingrata,
Dize-me: Eu quero!
Basta uma vez.
Mas se antes folgas de me ouvir na lyraLouvor singelo dos amores meus,Porque minha alma ha tanto em vão suspira;Dize-me, oh bella,Dize-me: Eu te amo!Basta uma vez.
Mas se antes folgas de me ouvir na lyra
Louvor singelo dos amores meus,
Porque minha alma ha tanto em vão suspira;
Dize-me, oh bella,
Dize-me: Eu te amo!
Basta uma vez.
Gonçalves Dias,Ib., p. 117.
Gonçalves Dias,Ib., p. 117.
Nas horas da noite, se junto ao meu leitoHouveres acaso, meu bem, de chegar,Verás de repente que aspecto risonhoQue toma o meu sonho,Se o vens bafejar!O anjo, que ao somno preside tranquillo,Ao anjo da terra não cêda o logar;Mas deixe-o amoroso chegar-se ao meu leito,Unir-se ao meu peito,D'amor offegar.As notas que exhalam as harpas celestes,Os gosos que os anjos só podem gosar,Talvez tambem frúa, se ao meu peito unidaTe encontro, oh querida,No meu acordar!Gonçalves Dias,Novos Cantos, p. 186.
Nas horas da noite, se junto ao meu leitoHouveres acaso, meu bem, de chegar,Verás de repente que aspecto risonhoQue toma o meu sonho,Se o vens bafejar!O anjo, que ao somno preside tranquillo,Ao anjo da terra não cêda o logar;Mas deixe-o amoroso chegar-se ao meu leito,Unir-se ao meu peito,D'amor offegar.As notas que exhalam as harpas celestes,Os gosos que os anjos só podem gosar,Talvez tambem frúa, se ao meu peito unidaTe encontro, oh querida,No meu acordar!Gonçalves Dias,Novos Cantos, p. 186.
Nas horas da noite, se junto ao meu leitoHouveres acaso, meu bem, de chegar,Verás de repente que aspecto risonhoQue toma o meu sonho,Se o vens bafejar!
Nas horas da noite, se junto ao meu leito
Houveres acaso, meu bem, de chegar,
Verás de repente que aspecto risonho
Que toma o meu sonho,
Se o vens bafejar!
O anjo, que ao somno preside tranquillo,Ao anjo da terra não cêda o logar;Mas deixe-o amoroso chegar-se ao meu leito,Unir-se ao meu peito,D'amor offegar.
O anjo, que ao somno preside tranquillo,
Ao anjo da terra não cêda o logar;
Mas deixe-o amoroso chegar-se ao meu leito,
Unir-se ao meu peito,
D'amor offegar.
As notas que exhalam as harpas celestes,Os gosos que os anjos só podem gosar,Talvez tambem frúa, se ao meu peito unidaTe encontro, oh querida,No meu acordar!
As notas que exhalam as harpas celestes,
Os gosos que os anjos só podem gosar,
Talvez tambem frúa, se ao meu peito unida
Te encontro, oh querida,
No meu acordar!
Gonçalves Dias,Novos Cantos, p. 186.
Gonçalves Dias,Novos Cantos, p. 186.
Meu anjo, escuta: quando junto á noitePerpassa a brisa pelo rosto teu,Como suspiro que um menino exhala;Na voz da brisa que murmura e fallaBrando queixume, que tão triste calaNo peito teu?Sou eu; sou eu; sou eu!Quando tu sentes luctuosa imagemD'afflicto pranto com sombrio véo,Rasgando o peito por acerbas dôres;Quem murcha as floresDo brando sonho?—Quem te pinta amoresDe um puro céo?Sou eu; sou eu; sou eu!Se alguem te accorda do celeste arroubo,Na amenidade do silencio teu,Quando tua alma n'outros mundos erra,Se alguem descerraAo lado teuFraco suspiro, que no peito encerra;Sou eu; sou eu; sou eu!Se alguem se afflige de te vêr chorosa,Se alguem se alegra co'um sorriso teu,Se alguem suspira de te vêr formosaO mar e a terra a enamorar o céo;Se alguem definhaPor amor teu,Sou eu; sou eu; sou eu!Gonçalves Dias,Ultimos Cantos, p. 378.
Meu anjo, escuta: quando junto á noitePerpassa a brisa pelo rosto teu,Como suspiro que um menino exhala;Na voz da brisa que murmura e fallaBrando queixume, que tão triste calaNo peito teu?Sou eu; sou eu; sou eu!Quando tu sentes luctuosa imagemD'afflicto pranto com sombrio véo,Rasgando o peito por acerbas dôres;Quem murcha as floresDo brando sonho?—Quem te pinta amoresDe um puro céo?Sou eu; sou eu; sou eu!Se alguem te accorda do celeste arroubo,Na amenidade do silencio teu,Quando tua alma n'outros mundos erra,Se alguem descerraAo lado teuFraco suspiro, que no peito encerra;Sou eu; sou eu; sou eu!Se alguem se afflige de te vêr chorosa,Se alguem se alegra co'um sorriso teu,Se alguem suspira de te vêr formosaO mar e a terra a enamorar o céo;Se alguem definhaPor amor teu,Sou eu; sou eu; sou eu!Gonçalves Dias,Ultimos Cantos, p. 378.
Meu anjo, escuta: quando junto á noitePerpassa a brisa pelo rosto teu,Como suspiro que um menino exhala;Na voz da brisa que murmura e fallaBrando queixume, que tão triste calaNo peito teu?Sou eu; sou eu; sou eu!
Meu anjo, escuta: quando junto á noite
Perpassa a brisa pelo rosto teu,
Como suspiro que um menino exhala;
Na voz da brisa que murmura e falla
Brando queixume, que tão triste cala
No peito teu?
Sou eu; sou eu; sou eu!
Quando tu sentes luctuosa imagemD'afflicto pranto com sombrio véo,Rasgando o peito por acerbas dôres;Quem murcha as floresDo brando sonho?—Quem te pinta amoresDe um puro céo?Sou eu; sou eu; sou eu!
Quando tu sentes luctuosa imagem
D'afflicto pranto com sombrio véo,
Rasgando o peito por acerbas dôres;
Quem murcha as flores
Do brando sonho?—Quem te pinta amores
De um puro céo?
Sou eu; sou eu; sou eu!
Se alguem te accorda do celeste arroubo,Na amenidade do silencio teu,Quando tua alma n'outros mundos erra,Se alguem descerraAo lado teuFraco suspiro, que no peito encerra;Sou eu; sou eu; sou eu!
Se alguem te accorda do celeste arroubo,
Na amenidade do silencio teu,
Quando tua alma n'outros mundos erra,
Se alguem descerra
Ao lado teu
Fraco suspiro, que no peito encerra;
Sou eu; sou eu; sou eu!
Se alguem se afflige de te vêr chorosa,Se alguem se alegra co'um sorriso teu,Se alguem suspira de te vêr formosaO mar e a terra a enamorar o céo;Se alguem definhaPor amor teu,Sou eu; sou eu; sou eu!
Se alguem se afflige de te vêr chorosa,
Se alguem se alegra co'um sorriso teu,
Se alguem suspira de te vêr formosa
O mar e a terra a enamorar o céo;
Se alguem definha
Por amor teu,
Sou eu; sou eu; sou eu!
Gonçalves Dias,Ultimos Cantos, p. 378.
Gonçalves Dias,Ultimos Cantos, p. 378.
Quando eu te fujo e me desvio cautoDa luz de fogo que te cerca, oh bella,Comtigo dizes, suspirando amores:«Meu Deus! que gelo, que frieza aquella!»Como te enganas! meu amor é chammaQue se alimenta no voraz segredo,E se te fujo, é que te adoro louco...És bella,—eu moço; tens amor,—eu medo!...Tenho medo de mim, de ti, de tudo,Da luz, da sombra, do silencio ou vozes,Das folhas seccas, do chorar das fontes,Das horas longas a correr velozes.O véo da noite me atormenta em dores,A luz da aurora me entumece os seios,E ao vento fresco do caír das tardesEu me estremeço de crueis receios.É que esse vento, que na varzea—ao longe,Do côlmo o fumo caprixoso ondeia,Soprando um dia, tornaria incendioA chamma viva que teu riso atêa.Ai! se abrazado crepitasse o cedro,Cedendo ao raio que a tormenta envia,Diz:—que seria da plantinha humildeQue á sombra d'elle tão feliz crescia?A labareda que se enrosca ao troncoTorrára a planta qual queimára o galho,E a pobre nunca reviver poderaChovesse embora paternal orvalho!
Quando eu te fujo e me desvio cautoDa luz de fogo que te cerca, oh bella,Comtigo dizes, suspirando amores:«Meu Deus! que gelo, que frieza aquella!»Como te enganas! meu amor é chammaQue se alimenta no voraz segredo,E se te fujo, é que te adoro louco...És bella,—eu moço; tens amor,—eu medo!...Tenho medo de mim, de ti, de tudo,Da luz, da sombra, do silencio ou vozes,Das folhas seccas, do chorar das fontes,Das horas longas a correr velozes.O véo da noite me atormenta em dores,A luz da aurora me entumece os seios,E ao vento fresco do caír das tardesEu me estremeço de crueis receios.É que esse vento, que na varzea—ao longe,Do côlmo o fumo caprixoso ondeia,Soprando um dia, tornaria incendioA chamma viva que teu riso atêa.Ai! se abrazado crepitasse o cedro,Cedendo ao raio que a tormenta envia,Diz:—que seria da plantinha humildeQue á sombra d'elle tão feliz crescia?A labareda que se enrosca ao troncoTorrára a planta qual queimára o galho,E a pobre nunca reviver poderaChovesse embora paternal orvalho!
Quando eu te fujo e me desvio cautoDa luz de fogo que te cerca, oh bella,Comtigo dizes, suspirando amores:«Meu Deus! que gelo, que frieza aquella!»
Quando eu te fujo e me desvio cauto
Da luz de fogo que te cerca, oh bella,
Comtigo dizes, suspirando amores:
«Meu Deus! que gelo, que frieza aquella!»
Como te enganas! meu amor é chammaQue se alimenta no voraz segredo,E se te fujo, é que te adoro louco...És bella,—eu moço; tens amor,—eu medo!...
Como te enganas! meu amor é chamma
Que se alimenta no voraz segredo,
E se te fujo, é que te adoro louco...
És bella,—eu moço; tens amor,—eu medo!...
Tenho medo de mim, de ti, de tudo,Da luz, da sombra, do silencio ou vozes,Das folhas seccas, do chorar das fontes,Das horas longas a correr velozes.
Tenho medo de mim, de ti, de tudo,
Da luz, da sombra, do silencio ou vozes,
Das folhas seccas, do chorar das fontes,
Das horas longas a correr velozes.
O véo da noite me atormenta em dores,A luz da aurora me entumece os seios,E ao vento fresco do caír das tardesEu me estremeço de crueis receios.
O véo da noite me atormenta em dores,
A luz da aurora me entumece os seios,
E ao vento fresco do caír das tardes
Eu me estremeço de crueis receios.
É que esse vento, que na varzea—ao longe,Do côlmo o fumo caprixoso ondeia,Soprando um dia, tornaria incendioA chamma viva que teu riso atêa.
É que esse vento, que na varzea—ao longe,
Do côlmo o fumo caprixoso ondeia,
Soprando um dia, tornaria incendio
A chamma viva que teu riso atêa.
Ai! se abrazado crepitasse o cedro,Cedendo ao raio que a tormenta envia,Diz:—que seria da plantinha humildeQue á sombra d'elle tão feliz crescia?
Ai! se abrazado crepitasse o cedro,
Cedendo ao raio que a tormenta envia,
Diz:—que seria da plantinha humilde
Que á sombra d'elle tão feliz crescia?
A labareda que se enrosca ao troncoTorrára a planta qual queimára o galho,E a pobre nunca reviver poderaChovesse embora paternal orvalho!
A labareda que se enrosca ao tronco
Torrára a planta qual queimára o galho,
E a pobre nunca reviver podera
Chovesse embora paternal orvalho!
Ai! se eu te visse no calor da sesta,A mão tremente no calor das tuas,Amarrotado o teu vestido branco,Sôltos cabellos nas espaduas núas!...Ai! se eu te visse, Magdalena pura,Sobre o velludo reclinada a meio,Olhos cerrados na volupia doce,Os braços frouxos—palpitante o seio.Ai! se eu te visse em languidez sublime,Na face as rosas virginaes do pejo,Trémula a falla a protestar baixinho...Vermelha a bocca, soluçando um beijo!...Diz:—que seria da pureza d'anjo,Das vestes alvas, do candor das azas!...—Tu te queimáras, a pizar descalça,Criança louca, sobre um chão de brazas!No fogo vivo eu me abrazára inteiro!Ebrio e sedento na fugaz vertigem;Vil, machucára com meu dedo impuroAs pobres flores da grinalda virgem!Vampiro infame, eu sorveria em beijosToda a innocencia que teu labio encerra,E tu serias no lascivo abraço,Anjo enlodado nos paúes da terra.Depois... desperta no febril delirio,Olhos pisados, como um vão lamento,Tu perguntáras: que é da minha corôa?...Eu te diria: desfolhou-a o vento!...Oh! não me chames coração de gelo!Bem vês; trahi-me no fatal segredo.Se de ti fujo, é que te adoro e muito,És bella,—eu moço; tens amor, eu—medo.Casemiro de Abreu,Primaveras, p. 131. Lisboa.
Ai! se eu te visse no calor da sesta,A mão tremente no calor das tuas,Amarrotado o teu vestido branco,Sôltos cabellos nas espaduas núas!...Ai! se eu te visse, Magdalena pura,Sobre o velludo reclinada a meio,Olhos cerrados na volupia doce,Os braços frouxos—palpitante o seio.Ai! se eu te visse em languidez sublime,Na face as rosas virginaes do pejo,Trémula a falla a protestar baixinho...Vermelha a bocca, soluçando um beijo!...Diz:—que seria da pureza d'anjo,Das vestes alvas, do candor das azas!...—Tu te queimáras, a pizar descalça,Criança louca, sobre um chão de brazas!No fogo vivo eu me abrazára inteiro!Ebrio e sedento na fugaz vertigem;Vil, machucára com meu dedo impuroAs pobres flores da grinalda virgem!Vampiro infame, eu sorveria em beijosToda a innocencia que teu labio encerra,E tu serias no lascivo abraço,Anjo enlodado nos paúes da terra.Depois... desperta no febril delirio,Olhos pisados, como um vão lamento,Tu perguntáras: que é da minha corôa?...Eu te diria: desfolhou-a o vento!...Oh! não me chames coração de gelo!Bem vês; trahi-me no fatal segredo.Se de ti fujo, é que te adoro e muito,És bella,—eu moço; tens amor, eu—medo.Casemiro de Abreu,Primaveras, p. 131. Lisboa.
Ai! se eu te visse no calor da sesta,A mão tremente no calor das tuas,Amarrotado o teu vestido branco,Sôltos cabellos nas espaduas núas!...
Ai! se eu te visse no calor da sesta,
A mão tremente no calor das tuas,
Amarrotado o teu vestido branco,
Sôltos cabellos nas espaduas núas!...
Ai! se eu te visse, Magdalena pura,Sobre o velludo reclinada a meio,Olhos cerrados na volupia doce,Os braços frouxos—palpitante o seio.
Ai! se eu te visse, Magdalena pura,
Sobre o velludo reclinada a meio,
Olhos cerrados na volupia doce,
Os braços frouxos—palpitante o seio.
Ai! se eu te visse em languidez sublime,Na face as rosas virginaes do pejo,Trémula a falla a protestar baixinho...Vermelha a bocca, soluçando um beijo!...
Ai! se eu te visse em languidez sublime,
Na face as rosas virginaes do pejo,
Trémula a falla a protestar baixinho...
Vermelha a bocca, soluçando um beijo!...
Diz:—que seria da pureza d'anjo,Das vestes alvas, do candor das azas!...—Tu te queimáras, a pizar descalça,Criança louca, sobre um chão de brazas!
Diz:—que seria da pureza d'anjo,
Das vestes alvas, do candor das azas!...
—Tu te queimáras, a pizar descalça,
Criança louca, sobre um chão de brazas!
No fogo vivo eu me abrazára inteiro!Ebrio e sedento na fugaz vertigem;Vil, machucára com meu dedo impuroAs pobres flores da grinalda virgem!
No fogo vivo eu me abrazára inteiro!
Ebrio e sedento na fugaz vertigem;
Vil, machucára com meu dedo impuro
As pobres flores da grinalda virgem!
Vampiro infame, eu sorveria em beijosToda a innocencia que teu labio encerra,E tu serias no lascivo abraço,Anjo enlodado nos paúes da terra.
Vampiro infame, eu sorveria em beijos
Toda a innocencia que teu labio encerra,
E tu serias no lascivo abraço,
Anjo enlodado nos paúes da terra.
Depois... desperta no febril delirio,Olhos pisados, como um vão lamento,Tu perguntáras: que é da minha corôa?...Eu te diria: desfolhou-a o vento!...
Depois... desperta no febril delirio,
Olhos pisados, como um vão lamento,
Tu perguntáras: que é da minha corôa?...
Eu te diria: desfolhou-a o vento!...
Oh! não me chames coração de gelo!Bem vês; trahi-me no fatal segredo.Se de ti fujo, é que te adoro e muito,És bella,—eu moço; tens amor, eu—medo.
Oh! não me chames coração de gelo!
Bem vês; trahi-me no fatal segredo.
Se de ti fujo, é que te adoro e muito,
És bella,—eu moço; tens amor, eu—medo.
Casemiro de Abreu,Primaveras, p. 131. Lisboa.
Casemiro de Abreu,Primaveras, p. 131. Lisboa.
Nas horas ardentes do pino do diaAo bosque corri;E qual linda imagem dos castos amores,Dormindo e sonhando cercada de floresNos bosques a vi!Dormia deitada na rêde de pennas,O céo por docel,De leve embalada no quieto balanço,Qual nauta scismando n'um lago bem manso,N'um leve batel.Dormia e sonhava;—no rosto, serena,Qual um seraphim;Os cilios pendidos nos olhos tão bellos,E a brisa brincando nos sôltos cabellos,De fino setim!Dormia e sonhava—formosa, embebidaNo doce sonhar,E doce e sereno, n'um magico anceioDebaixo das roupas batia-lhe o seioNo seu palpitar.Dormia e sonhava,—a bocca entre-aberta,O labio a sorrir;No peito cruzados os braços dormentes,Compridos e lisos quaes brancas serpentes,No collo a dormir!Dormia e sonhava—no sonho d'amoresChamava por mim;E a voz suspirosa nos labios morriaTão terna e tão meiga qual vaga harmoniaDe algum bandolim!Dormia e sonhava—de manso cheguei-meSem leve rumor,Pendi-me tremendo e, qual fraco vagido,Qual sopro da briza, baixinho ao ouvidoFallei-lhe de amor!Ao halito ardente o peito palpita...Mas sem despertar;E como nas ancias de um sonho que é lindo,A virgem na rêde córando e sorrindo...Beijou-me a sonhar!...Casimiro de Abreu,Ibid., p. 95.
Nas horas ardentes do pino do diaAo bosque corri;E qual linda imagem dos castos amores,Dormindo e sonhando cercada de floresNos bosques a vi!Dormia deitada na rêde de pennas,O céo por docel,De leve embalada no quieto balanço,Qual nauta scismando n'um lago bem manso,N'um leve batel.Dormia e sonhava;—no rosto, serena,Qual um seraphim;Os cilios pendidos nos olhos tão bellos,E a brisa brincando nos sôltos cabellos,De fino setim!Dormia e sonhava—formosa, embebidaNo doce sonhar,E doce e sereno, n'um magico anceioDebaixo das roupas batia-lhe o seioNo seu palpitar.Dormia e sonhava,—a bocca entre-aberta,O labio a sorrir;No peito cruzados os braços dormentes,Compridos e lisos quaes brancas serpentes,No collo a dormir!Dormia e sonhava—no sonho d'amoresChamava por mim;E a voz suspirosa nos labios morriaTão terna e tão meiga qual vaga harmoniaDe algum bandolim!Dormia e sonhava—de manso cheguei-meSem leve rumor,Pendi-me tremendo e, qual fraco vagido,Qual sopro da briza, baixinho ao ouvidoFallei-lhe de amor!Ao halito ardente o peito palpita...Mas sem despertar;E como nas ancias de um sonho que é lindo,A virgem na rêde córando e sorrindo...Beijou-me a sonhar!...Casimiro de Abreu,Ibid., p. 95.
Nas horas ardentes do pino do diaAo bosque corri;E qual linda imagem dos castos amores,Dormindo e sonhando cercada de floresNos bosques a vi!Dormia deitada na rêde de pennas,O céo por docel,De leve embalada no quieto balanço,Qual nauta scismando n'um lago bem manso,N'um leve batel.
Nas horas ardentes do pino do dia
Ao bosque corri;
E qual linda imagem dos castos amores,
Dormindo e sonhando cercada de flores
Nos bosques a vi!
Dormia deitada na rêde de pennas,
O céo por docel,
De leve embalada no quieto balanço,
Qual nauta scismando n'um lago bem manso,
N'um leve batel.
Dormia e sonhava;—no rosto, serena,Qual um seraphim;Os cilios pendidos nos olhos tão bellos,E a brisa brincando nos sôltos cabellos,De fino setim!
Dormia e sonhava;—no rosto, serena,
Qual um seraphim;
Os cilios pendidos nos olhos tão bellos,
E a brisa brincando nos sôltos cabellos,
De fino setim!
Dormia e sonhava—formosa, embebidaNo doce sonhar,E doce e sereno, n'um magico anceioDebaixo das roupas batia-lhe o seioNo seu palpitar.
Dormia e sonhava—formosa, embebida
No doce sonhar,
E doce e sereno, n'um magico anceio
Debaixo das roupas batia-lhe o seio
No seu palpitar.
Dormia e sonhava,—a bocca entre-aberta,O labio a sorrir;No peito cruzados os braços dormentes,Compridos e lisos quaes brancas serpentes,No collo a dormir!
Dormia e sonhava,—a bocca entre-aberta,
O labio a sorrir;
No peito cruzados os braços dormentes,
Compridos e lisos quaes brancas serpentes,
No collo a dormir!
Dormia e sonhava—no sonho d'amoresChamava por mim;E a voz suspirosa nos labios morriaTão terna e tão meiga qual vaga harmoniaDe algum bandolim!
Dormia e sonhava—no sonho d'amores
Chamava por mim;
E a voz suspirosa nos labios morria
Tão terna e tão meiga qual vaga harmonia
De algum bandolim!
Dormia e sonhava—de manso cheguei-meSem leve rumor,Pendi-me tremendo e, qual fraco vagido,Qual sopro da briza, baixinho ao ouvidoFallei-lhe de amor!Ao halito ardente o peito palpita...Mas sem despertar;E como nas ancias de um sonho que é lindo,A virgem na rêde córando e sorrindo...Beijou-me a sonhar!...
Dormia e sonhava—de manso cheguei-me
Sem leve rumor,
Pendi-me tremendo e, qual fraco vagido,
Qual sopro da briza, baixinho ao ouvido
Fallei-lhe de amor!
Ao halito ardente o peito palpita...
Mas sem despertar;
E como nas ancias de um sonho que é lindo,
A virgem na rêde córando e sorrindo...
Beijou-me a sonhar!...
Casimiro de Abreu,Ibid., p. 95.
Casimiro de Abreu,Ibid., p. 95.
Beijar-te a fronte linda:Beijar-te o aspecto altivo,Beijar-te a tez morena;Beijar-te o rir lascivo.Beijar o ár que aspiras,Beijar o pó que pisas,Beijar a voz que soltas.Beijar a luz, que visas.Sentir teus modos frios,Sentir tua apathia,Sentir até repudio,Sentir essa ironia;Sentir que me resguardas,Sentir que me arreceias,Sentir que me repugnas,Sentir que até me odeias;Eis a descrença e a crença,Eis o absyntho e a flor,Eis o amor e o odio,Eis o prazer e a dor!Eis o estertor da morte,Eis o martyrio eterno,Eis o ranger dos dentesEis o penar do inferno.Junqueira Freire,Contradicções poeticas, p. 79.
Beijar-te a fronte linda:Beijar-te o aspecto altivo,Beijar-te a tez morena;Beijar-te o rir lascivo.Beijar o ár que aspiras,Beijar o pó que pisas,Beijar a voz que soltas.Beijar a luz, que visas.Sentir teus modos frios,Sentir tua apathia,Sentir até repudio,Sentir essa ironia;Sentir que me resguardas,Sentir que me arreceias,Sentir que me repugnas,Sentir que até me odeias;Eis a descrença e a crença,Eis o absyntho e a flor,Eis o amor e o odio,Eis o prazer e a dor!Eis o estertor da morte,Eis o martyrio eterno,Eis o ranger dos dentesEis o penar do inferno.Junqueira Freire,Contradicções poeticas, p. 79.
Beijar-te a fronte linda:Beijar-te o aspecto altivo,Beijar-te a tez morena;Beijar-te o rir lascivo.
Beijar-te a fronte linda:
Beijar-te o aspecto altivo,
Beijar-te a tez morena;
Beijar-te o rir lascivo.
Beijar o ár que aspiras,Beijar o pó que pisas,Beijar a voz que soltas.Beijar a luz, que visas.
Beijar o ár que aspiras,
Beijar o pó que pisas,
Beijar a voz que soltas.
Beijar a luz, que visas.
Sentir teus modos frios,Sentir tua apathia,Sentir até repudio,Sentir essa ironia;
Sentir teus modos frios,
Sentir tua apathia,
Sentir até repudio,
Sentir essa ironia;
Sentir que me resguardas,Sentir que me arreceias,Sentir que me repugnas,Sentir que até me odeias;
Sentir que me resguardas,
Sentir que me arreceias,
Sentir que me repugnas,
Sentir que até me odeias;
Eis a descrença e a crença,Eis o absyntho e a flor,Eis o amor e o odio,Eis o prazer e a dor!
Eis a descrença e a crença,
Eis o absyntho e a flor,
Eis o amor e o odio,
Eis o prazer e a dor!
Eis o estertor da morte,Eis o martyrio eterno,Eis o ranger dos dentesEis o penar do inferno.
Eis o estertor da morte,
Eis o martyrio eterno,
Eis o ranger dos dentes
Eis o penar do inferno.
Junqueira Freire,Contradicções poeticas, p. 79.
Junqueira Freire,Contradicções poeticas, p. 79.
Ella tambem ouviu o som das vagasSobre os rochedos—e talvez dissesse:—O som das aguas que embellece os outros,Não me embellece.Ella tambem sentiu a fresca aragemSobre os cabellos—e talvez dissesse:—A fresca aragem que adormece os outrosNão me adormece.Ella tambem deitou-se no serenoSobre estas relvas—e talvez dissesse:—Este sereno que empallece os outrosNão me empallece.Ella tambem olhou estas montanhasSobre as campinas—e talvez dissesse:—A vista d'ella, que embevece os outrosNão me embevece.Ella tambem andou ao sol ardenteSobre as planicies—e talvez dissesse:—O sol ardente que enrubece os outrosNão me enrubece.Ella tambem provou dos cardos frescosSobre as areias—e talvez dissesse:—O gosto d'elles, que arrefece os outros,Não me arrefece.Elle tambem sentou-se n'este muro,Sobre estas pedras—e talvez dissesse:—Esta quadra gentil que encanta os outrosJá me aborrece.Este quadro gentil agrada aos outros,É bello todo—ella talvez dissesse!—Porém tão longe o meu amor! oh, tudoTudo fallece!Sim, ella o disse merencoria e amante,Impios não duvideis que ella o dissesse:—Tão longe d'elle assim! sem vida tudo,Tudo parece!Junqueira Freire,Ibidem, p. 117.
Ella tambem ouviu o som das vagasSobre os rochedos—e talvez dissesse:—O som das aguas que embellece os outros,Não me embellece.Ella tambem sentiu a fresca aragemSobre os cabellos—e talvez dissesse:—A fresca aragem que adormece os outrosNão me adormece.Ella tambem deitou-se no serenoSobre estas relvas—e talvez dissesse:—Este sereno que empallece os outrosNão me empallece.Ella tambem olhou estas montanhasSobre as campinas—e talvez dissesse:—A vista d'ella, que embevece os outrosNão me embevece.Ella tambem andou ao sol ardenteSobre as planicies—e talvez dissesse:—O sol ardente que enrubece os outrosNão me enrubece.Ella tambem provou dos cardos frescosSobre as areias—e talvez dissesse:—O gosto d'elles, que arrefece os outros,Não me arrefece.Elle tambem sentou-se n'este muro,Sobre estas pedras—e talvez dissesse:—Esta quadra gentil que encanta os outrosJá me aborrece.Este quadro gentil agrada aos outros,É bello todo—ella talvez dissesse!—Porém tão longe o meu amor! oh, tudoTudo fallece!Sim, ella o disse merencoria e amante,Impios não duvideis que ella o dissesse:—Tão longe d'elle assim! sem vida tudo,Tudo parece!Junqueira Freire,Ibidem, p. 117.
Ella tambem ouviu o som das vagasSobre os rochedos—e talvez dissesse:—O som das aguas que embellece os outros,Não me embellece.
Ella tambem ouviu o som das vagas
Sobre os rochedos—e talvez dissesse:
—O som das aguas que embellece os outros,
Não me embellece.
Ella tambem sentiu a fresca aragemSobre os cabellos—e talvez dissesse:—A fresca aragem que adormece os outrosNão me adormece.
Ella tambem sentiu a fresca aragem
Sobre os cabellos—e talvez dissesse:
—A fresca aragem que adormece os outros
Não me adormece.
Ella tambem deitou-se no serenoSobre estas relvas—e talvez dissesse:—Este sereno que empallece os outrosNão me empallece.
Ella tambem deitou-se no sereno
Sobre estas relvas—e talvez dissesse:
—Este sereno que empallece os outros
Não me empallece.
Ella tambem olhou estas montanhasSobre as campinas—e talvez dissesse:—A vista d'ella, que embevece os outrosNão me embevece.
Ella tambem olhou estas montanhas
Sobre as campinas—e talvez dissesse:
—A vista d'ella, que embevece os outros
Não me embevece.
Ella tambem andou ao sol ardenteSobre as planicies—e talvez dissesse:—O sol ardente que enrubece os outrosNão me enrubece.
Ella tambem andou ao sol ardente
Sobre as planicies—e talvez dissesse:
—O sol ardente que enrubece os outros
Não me enrubece.
Ella tambem provou dos cardos frescosSobre as areias—e talvez dissesse:—O gosto d'elles, que arrefece os outros,Não me arrefece.
Ella tambem provou dos cardos frescos
Sobre as areias—e talvez dissesse:
—O gosto d'elles, que arrefece os outros,
Não me arrefece.
Elle tambem sentou-se n'este muro,Sobre estas pedras—e talvez dissesse:—Esta quadra gentil que encanta os outrosJá me aborrece.
Elle tambem sentou-se n'este muro,
Sobre estas pedras—e talvez dissesse:
—Esta quadra gentil que encanta os outros
Já me aborrece.
Este quadro gentil agrada aos outros,É bello todo—ella talvez dissesse!—Porém tão longe o meu amor! oh, tudoTudo fallece!
Este quadro gentil agrada aos outros,
É bello todo—ella talvez dissesse!
—Porém tão longe o meu amor! oh, tudo
Tudo fallece!
Sim, ella o disse merencoria e amante,Impios não duvideis que ella o dissesse:—Tão longe d'elle assim! sem vida tudo,Tudo parece!
Sim, ella o disse merencoria e amante,
Impios não duvideis que ella o dissesse:
—Tão longe d'elle assim! sem vida tudo,
Tudo parece!
Junqueira Freire,Ibidem, p. 117.
Junqueira Freire,Ibidem, p. 117.
Eu amo as floresQue mudamentePaixões explicamQue o peito sente,Amo a saudade,O amor perfeito,Mas o suspiroTrago no peito.A forma esbeltaTermina em ponta,Como uma lançaQue ao céo remonta.Assim, minha alma,Suspiros gerasQue ferir podemAs mesmas féras.É sempre triste,Ensanguentado,Quer secco morra,Quer brilhe em prado.Taes meus suspiros...Mas não prosigas,Ninguem se movePor mais digas.D. J. Gonçalves Magalhães,Suspiros poeticos, p. 239. Pariz 1859.
Eu amo as floresQue mudamentePaixões explicamQue o peito sente,Amo a saudade,O amor perfeito,Mas o suspiroTrago no peito.A forma esbeltaTermina em ponta,Como uma lançaQue ao céo remonta.Assim, minha alma,Suspiros gerasQue ferir podemAs mesmas féras.É sempre triste,Ensanguentado,Quer secco morra,Quer brilhe em prado.Taes meus suspiros...Mas não prosigas,Ninguem se movePor mais digas.D. J. Gonçalves Magalhães,Suspiros poeticos, p. 239. Pariz 1859.
Eu amo as floresQue mudamentePaixões explicamQue o peito sente,Amo a saudade,O amor perfeito,Mas o suspiroTrago no peito.
Eu amo as flores
Que mudamente
Paixões explicam
Que o peito sente,
Amo a saudade,
O amor perfeito,
Mas o suspiro
Trago no peito.
A forma esbeltaTermina em ponta,Como uma lançaQue ao céo remonta.Assim, minha alma,Suspiros gerasQue ferir podemAs mesmas féras.
A forma esbelta
Termina em ponta,
Como uma lança
Que ao céo remonta.
Assim, minha alma,
Suspiros geras
Que ferir podem
As mesmas féras.
É sempre triste,Ensanguentado,Quer secco morra,Quer brilhe em prado.Taes meus suspiros...Mas não prosigas,Ninguem se movePor mais digas.
É sempre triste,
Ensanguentado,
Quer secco morra,
Quer brilhe em prado.
Taes meus suspiros...
Mas não prosigas,
Ninguem se move
Por mais digas.
D. J. Gonçalves Magalhães,Suspiros poeticos, p. 239. Pariz 1859.
D. J. Gonçalves Magalhães,Suspiros poeticos, p. 239. Pariz 1859.
Quando me volves teus formosos olhos,Meigos, banhados de celeste encanto,Rasgo uma folha da carteira, e a lapisEscrevo um canto,Quando nos labios do rubim mais puroMostras-me um riso seductor, faceto,Encommendo minh'alma ás nove muzas,Faço um soneto.Quando ao passeio, no mover das roupas,Deixas de leve vêr teu pé divino,Sinto as arterias palpitarem tumidas,Componho um hymno.Quando no marmor das espaduas bellas,As negras tranças a tremer sacodes,Ebrio de amor, sorvendo seus perfumes,Rimo dez odes.Quando á noitinha, me fallando a medoElevas-me do céo á luz suprema,Esqueçoi-me do mundo e de mim mesmo,Gero um poema.L. N. Fagundes Varella,Cantos do ermo e da cidade, p. 149.
Quando me volves teus formosos olhos,Meigos, banhados de celeste encanto,Rasgo uma folha da carteira, e a lapisEscrevo um canto,Quando nos labios do rubim mais puroMostras-me um riso seductor, faceto,Encommendo minh'alma ás nove muzas,Faço um soneto.Quando ao passeio, no mover das roupas,Deixas de leve vêr teu pé divino,Sinto as arterias palpitarem tumidas,Componho um hymno.Quando no marmor das espaduas bellas,As negras tranças a tremer sacodes,Ebrio de amor, sorvendo seus perfumes,Rimo dez odes.Quando á noitinha, me fallando a medoElevas-me do céo á luz suprema,Esqueçoi-me do mundo e de mim mesmo,Gero um poema.L. N. Fagundes Varella,Cantos do ermo e da cidade, p. 149.
Quando me volves teus formosos olhos,Meigos, banhados de celeste encanto,Rasgo uma folha da carteira, e a lapisEscrevo um canto,
Quando me volves teus formosos olhos,
Meigos, banhados de celeste encanto,
Rasgo uma folha da carteira, e a lapis
Escrevo um canto,
Quando nos labios do rubim mais puroMostras-me um riso seductor, faceto,Encommendo minh'alma ás nove muzas,Faço um soneto.
Quando nos labios do rubim mais puro
Mostras-me um riso seductor, faceto,
Encommendo minh'alma ás nove muzas,
Faço um soneto.
Quando ao passeio, no mover das roupas,Deixas de leve vêr teu pé divino,Sinto as arterias palpitarem tumidas,Componho um hymno.
Quando ao passeio, no mover das roupas,
Deixas de leve vêr teu pé divino,
Sinto as arterias palpitarem tumidas,
Componho um hymno.
Quando no marmor das espaduas bellas,As negras tranças a tremer sacodes,Ebrio de amor, sorvendo seus perfumes,Rimo dez odes.
Quando no marmor das espaduas bellas,
As negras tranças a tremer sacodes,
Ebrio de amor, sorvendo seus perfumes,
Rimo dez odes.
Quando á noitinha, me fallando a medoElevas-me do céo á luz suprema,Esqueçoi-me do mundo e de mim mesmo,Gero um poema.
Quando á noitinha, me fallando a medo
Elevas-me do céo á luz suprema,
Esqueçoi-me do mundo e de mim mesmo,
Gero um poema.
L. N. Fagundes Varella,Cantos do ermo e da cidade, p. 149.
L. N. Fagundes Varella,Cantos do ermo e da cidade, p. 149.
Desde a quadra a mais antigaDe que rezam pergaminhos,Cantam a mesma cantigaNa floresta os passarinhos;Tem o mesmo aroma as flores,Mesma verdura as campinas,A briza os mesmos rumores,Mesma leveza as neblinas;Tem o sol as mesmas luzes,Tem o mar as mesmas vagas,O dezerto as mesmas urzes,A mesma dureza as fragas;Os mesmos tolos o mundo,A mulher o mesmo riso,O sepulchro o mesmo fundo,Os homens o mesmo siso;E n'este insipido giro,N'este vôo sempre a esmo,Vale a pena, em seu retiro,Cantar o poeta, mesmo?Fagundes Varella,Ibid., p. 151.
Desde a quadra a mais antigaDe que rezam pergaminhos,Cantam a mesma cantigaNa floresta os passarinhos;Tem o mesmo aroma as flores,Mesma verdura as campinas,A briza os mesmos rumores,Mesma leveza as neblinas;Tem o sol as mesmas luzes,Tem o mar as mesmas vagas,O dezerto as mesmas urzes,A mesma dureza as fragas;Os mesmos tolos o mundo,A mulher o mesmo riso,O sepulchro o mesmo fundo,Os homens o mesmo siso;E n'este insipido giro,N'este vôo sempre a esmo,Vale a pena, em seu retiro,Cantar o poeta, mesmo?Fagundes Varella,Ibid., p. 151.
Desde a quadra a mais antigaDe que rezam pergaminhos,Cantam a mesma cantigaNa floresta os passarinhos;
Desde a quadra a mais antiga
De que rezam pergaminhos,
Cantam a mesma cantiga
Na floresta os passarinhos;
Tem o mesmo aroma as flores,Mesma verdura as campinas,A briza os mesmos rumores,Mesma leveza as neblinas;
Tem o mesmo aroma as flores,
Mesma verdura as campinas,
A briza os mesmos rumores,
Mesma leveza as neblinas;
Tem o sol as mesmas luzes,Tem o mar as mesmas vagas,O dezerto as mesmas urzes,A mesma dureza as fragas;
Tem o sol as mesmas luzes,
Tem o mar as mesmas vagas,
O dezerto as mesmas urzes,
A mesma dureza as fragas;
Os mesmos tolos o mundo,A mulher o mesmo riso,O sepulchro o mesmo fundo,Os homens o mesmo siso;
Os mesmos tolos o mundo,
A mulher o mesmo riso,
O sepulchro o mesmo fundo,
Os homens o mesmo siso;
E n'este insipido giro,N'este vôo sempre a esmo,Vale a pena, em seu retiro,Cantar o poeta, mesmo?
E n'este insipido giro,
N'este vôo sempre a esmo,
Vale a pena, em seu retiro,
Cantar o poeta, mesmo?
Fagundes Varella,Ibid., p. 151.
Fagundes Varella,Ibid., p. 151.
Em teus travessos olhos,Mais lindos que as estrellasDo espaço, ás furtadelasMirando o escuro mar;Em teu olhar tyrannico,Cheio de vivo fogo,Meu sêr, minh'alma afógoDe amor a suspírar.Se teus encantos todosEu fosse a enumerar!...D'esses mimosos labiosQue ao beija-flor enganam,D'onde perpetuos manamPerfumes de encantar;D'esses lascivos labios,Macios, purpurinos,Ouvindo os sons divinosMe sinto desmaiar.Se teus encantos todosEu fosse a enumerar!...Tuas madeixas virgens,Cheirosas, fluctuantes,Teus seios palpitantesDa sêde do gozar;Tua cintura estreita,Teu pé subtil, conciso,Obumbram-me o juízo,Apagam-me o pensar.Se teus encantos todosEu fosse a enumerar!...Ai quebra-me estes ferrosFataes que nos separam,Os doudos que os forjaramNão sabem, não, amar.Da-me o teu corpo e alma,E á luz da liberdade,Oh minha divindadeCorramos a folgar.Se teus encantos todosEu fosse enumerar!...Fagundes Varela,Ibid., p. 43.
Em teus travessos olhos,Mais lindos que as estrellasDo espaço, ás furtadelasMirando o escuro mar;Em teu olhar tyrannico,Cheio de vivo fogo,Meu sêr, minh'alma afógoDe amor a suspírar.Se teus encantos todosEu fosse a enumerar!...D'esses mimosos labiosQue ao beija-flor enganam,D'onde perpetuos manamPerfumes de encantar;D'esses lascivos labios,Macios, purpurinos,Ouvindo os sons divinosMe sinto desmaiar.Se teus encantos todosEu fosse a enumerar!...Tuas madeixas virgens,Cheirosas, fluctuantes,Teus seios palpitantesDa sêde do gozar;Tua cintura estreita,Teu pé subtil, conciso,Obumbram-me o juízo,Apagam-me o pensar.Se teus encantos todosEu fosse a enumerar!...Ai quebra-me estes ferrosFataes que nos separam,Os doudos que os forjaramNão sabem, não, amar.Da-me o teu corpo e alma,E á luz da liberdade,Oh minha divindadeCorramos a folgar.Se teus encantos todosEu fosse enumerar!...Fagundes Varela,Ibid., p. 43.
Em teus travessos olhos,Mais lindos que as estrellasDo espaço, ás furtadelasMirando o escuro mar;Em teu olhar tyrannico,Cheio de vivo fogo,Meu sêr, minh'alma afógoDe amor a suspírar.
Em teus travessos olhos,
Mais lindos que as estrellas
Do espaço, ás furtadelas
Mirando o escuro mar;
Em teu olhar tyrannico,
Cheio de vivo fogo,
Meu sêr, minh'alma afógo
De amor a suspírar.
Se teus encantos todosEu fosse a enumerar!...
Se teus encantos todos
Eu fosse a enumerar!...
D'esses mimosos labiosQue ao beija-flor enganam,D'onde perpetuos manamPerfumes de encantar;D'esses lascivos labios,Macios, purpurinos,Ouvindo os sons divinosMe sinto desmaiar.
D'esses mimosos labios
Que ao beija-flor enganam,
D'onde perpetuos manam
Perfumes de encantar;
D'esses lascivos labios,
Macios, purpurinos,
Ouvindo os sons divinos
Me sinto desmaiar.
Se teus encantos todosEu fosse a enumerar!...
Se teus encantos todos
Eu fosse a enumerar!...
Tuas madeixas virgens,Cheirosas, fluctuantes,Teus seios palpitantesDa sêde do gozar;Tua cintura estreita,Teu pé subtil, conciso,Obumbram-me o juízo,Apagam-me o pensar.
Tuas madeixas virgens,
Cheirosas, fluctuantes,
Teus seios palpitantes
Da sêde do gozar;
Tua cintura estreita,
Teu pé subtil, conciso,
Obumbram-me o juízo,
Apagam-me o pensar.
Se teus encantos todosEu fosse a enumerar!...
Se teus encantos todos
Eu fosse a enumerar!...
Ai quebra-me estes ferrosFataes que nos separam,Os doudos que os forjaramNão sabem, não, amar.Da-me o teu corpo e alma,E á luz da liberdade,Oh minha divindadeCorramos a folgar.
Ai quebra-me estes ferros
Fataes que nos separam,
Os doudos que os forjaram
Não sabem, não, amar.
Da-me o teu corpo e alma,
E á luz da liberdade,
Oh minha divindade
Corramos a folgar.
Se teus encantos todosEu fosse enumerar!...
Se teus encantos todos
Eu fosse enumerar!...
Fagundes Varela,Ibid., p. 43.
Fagundes Varela,Ibid., p. 43.
O que eu adoro em ti não são teus olhos,Teus lindos olhos cheios de mysterio,Por cujo brilho os homens deixariamDa terra inteira o mais soberbo imperio.O que eu adoro em ti não são teus lábios,Onde perpetua juventude móra,E encerram mais perfumes do que os valles,Por entre as pompas festivaes da aurora.O que eu adoro em ti não é teu rostoPerante o qual o mármor descorára,E ao contemplar a esplendida harmoniaPhidias, o mestre, seu cinzel quebrára.O que eu adoro em ti não é teu colloMais bello que o da esposa israelita,Torre de graças, encantado asyloAonde o genio das paixões habita.O que eu adoro em ti não são teus seios,Alvas pombinhas que dormindo gemem,E do indiscreto vôo de uma abelhaCheias de medo em seu abrigo temem.O que eu adoro em ti, ouve, é tu'almaPura como o sorrir de uma criança,Alheia ao mundo, alheia aos preconceitos,Rica de crenças, rica de esperança.São as palavras de bondade infindaQue sabes murmurar aos que padecem,Os carinhos ingenuos de teus olhos,Onde celestes gozos transparecem!...Um não sei que, de grande, immaculado,Que faz estremecer quando tu fallas,E eleva-me o pensar além dos mundos,Quando abaixando as palpebras te callas.E por isso em meus sonhos sempre vi-teEntre nuvens de incenso em aras santas,E das turbas solicitas no meioTambem contricto hei te beijado as plantas.E como és linda assim! Chammas divinasCercam-te as faces placidas e bellas,Um longo manto pende-te dos hombros,Salpicado de nitidas estrellas!Na douda pyra de um amor terrestrePensei sagrar-te o coração demente...Mas ao mirar-te deslumbrou-me o raio...Tinhas nos olhos o perdão sómente!Fagundes Varella,Ibid., p. 68.
O que eu adoro em ti não são teus olhos,Teus lindos olhos cheios de mysterio,Por cujo brilho os homens deixariamDa terra inteira o mais soberbo imperio.O que eu adoro em ti não são teus lábios,Onde perpetua juventude móra,E encerram mais perfumes do que os valles,Por entre as pompas festivaes da aurora.O que eu adoro em ti não é teu rostoPerante o qual o mármor descorára,E ao contemplar a esplendida harmoniaPhidias, o mestre, seu cinzel quebrára.O que eu adoro em ti não é teu colloMais bello que o da esposa israelita,Torre de graças, encantado asyloAonde o genio das paixões habita.O que eu adoro em ti não são teus seios,Alvas pombinhas que dormindo gemem,E do indiscreto vôo de uma abelhaCheias de medo em seu abrigo temem.O que eu adoro em ti, ouve, é tu'almaPura como o sorrir de uma criança,Alheia ao mundo, alheia aos preconceitos,Rica de crenças, rica de esperança.São as palavras de bondade infindaQue sabes murmurar aos que padecem,Os carinhos ingenuos de teus olhos,Onde celestes gozos transparecem!...Um não sei que, de grande, immaculado,Que faz estremecer quando tu fallas,E eleva-me o pensar além dos mundos,Quando abaixando as palpebras te callas.E por isso em meus sonhos sempre vi-teEntre nuvens de incenso em aras santas,E das turbas solicitas no meioTambem contricto hei te beijado as plantas.E como és linda assim! Chammas divinasCercam-te as faces placidas e bellas,Um longo manto pende-te dos hombros,Salpicado de nitidas estrellas!Na douda pyra de um amor terrestrePensei sagrar-te o coração demente...Mas ao mirar-te deslumbrou-me o raio...Tinhas nos olhos o perdão sómente!Fagundes Varella,Ibid., p. 68.
O que eu adoro em ti não são teus olhos,Teus lindos olhos cheios de mysterio,Por cujo brilho os homens deixariamDa terra inteira o mais soberbo imperio.
O que eu adoro em ti não são teus olhos,
Teus lindos olhos cheios de mysterio,
Por cujo brilho os homens deixariam
Da terra inteira o mais soberbo imperio.
O que eu adoro em ti não são teus lábios,Onde perpetua juventude móra,E encerram mais perfumes do que os valles,Por entre as pompas festivaes da aurora.
O que eu adoro em ti não são teus lábios,
Onde perpetua juventude móra,
E encerram mais perfumes do que os valles,
Por entre as pompas festivaes da aurora.
O que eu adoro em ti não é teu rostoPerante o qual o mármor descorára,E ao contemplar a esplendida harmoniaPhidias, o mestre, seu cinzel quebrára.
O que eu adoro em ti não é teu rosto
Perante o qual o mármor descorára,
E ao contemplar a esplendida harmonia
Phidias, o mestre, seu cinzel quebrára.
O que eu adoro em ti não é teu colloMais bello que o da esposa israelita,Torre de graças, encantado asyloAonde o genio das paixões habita.
O que eu adoro em ti não é teu collo
Mais bello que o da esposa israelita,
Torre de graças, encantado asylo
Aonde o genio das paixões habita.
O que eu adoro em ti não são teus seios,Alvas pombinhas que dormindo gemem,E do indiscreto vôo de uma abelhaCheias de medo em seu abrigo temem.
O que eu adoro em ti não são teus seios,
Alvas pombinhas que dormindo gemem,
E do indiscreto vôo de uma abelha
Cheias de medo em seu abrigo temem.
O que eu adoro em ti, ouve, é tu'almaPura como o sorrir de uma criança,Alheia ao mundo, alheia aos preconceitos,Rica de crenças, rica de esperança.
O que eu adoro em ti, ouve, é tu'alma
Pura como o sorrir de uma criança,
Alheia ao mundo, alheia aos preconceitos,
Rica de crenças, rica de esperança.
São as palavras de bondade infindaQue sabes murmurar aos que padecem,Os carinhos ingenuos de teus olhos,Onde celestes gozos transparecem!...
São as palavras de bondade infinda
Que sabes murmurar aos que padecem,
Os carinhos ingenuos de teus olhos,
Onde celestes gozos transparecem!...
Um não sei que, de grande, immaculado,Que faz estremecer quando tu fallas,E eleva-me o pensar além dos mundos,Quando abaixando as palpebras te callas.
Um não sei que, de grande, immaculado,
Que faz estremecer quando tu fallas,
E eleva-me o pensar além dos mundos,
Quando abaixando as palpebras te callas.
E por isso em meus sonhos sempre vi-teEntre nuvens de incenso em aras santas,E das turbas solicitas no meioTambem contricto hei te beijado as plantas.
E por isso em meus sonhos sempre vi-te
Entre nuvens de incenso em aras santas,
E das turbas solicitas no meio
Tambem contricto hei te beijado as plantas.
E como és linda assim! Chammas divinasCercam-te as faces placidas e bellas,Um longo manto pende-te dos hombros,Salpicado de nitidas estrellas!
E como és linda assim! Chammas divinas
Cercam-te as faces placidas e bellas,
Um longo manto pende-te dos hombros,
Salpicado de nitidas estrellas!
Na douda pyra de um amor terrestrePensei sagrar-te o coração demente...Mas ao mirar-te deslumbrou-me o raio...Tinhas nos olhos o perdão sómente!
Na douda pyra de um amor terrestre
Pensei sagrar-te o coração demente...
Mas ao mirar-te deslumbrou-me o raio...
Tinhas nos olhos o perdão sómente!
Fagundes Varella,Ibid., p. 68.
Fagundes Varella,Ibid., p. 68.